Saturday, June 11, 2005

Apenas um Rato

Rafael Prosdocimi
Há algum tempo eu tecia a seguinte hipótese: “se eu não seria apenas um ratinho nesse mundo louco, que, por sua vez não seria apenas uma grande caixa de Skinner e, perguntava-me se tudo na vida realmente não se basearia em reforço e punição, se tudo não seria as contingências da vida e não haveria nada como consciência ou livre-arbítrio. E depois de tantas premissas angustiantes, eu refletia no porquê da minha insistência (incondicionada ou, não-adaptativa) em retirar o meu corpo de minha residência, no sábado à noite, e o levar a lugares que terminavam por apenas me levar de volta pra casa, culminando todo esse movimento em enorme dispêndio de moeda corrente e um grande acúmulo de tédio”.
Eu pensava que não poderia estar saindo de casa pra não obter um único grau de reforço e ficava bastante angustiado com isso. Pensava eu: “fique em casa, pois não há nada lá fora”. Hoje descobri de forma clara, tudo o que se passa comigo. Eu sou apenas um ratinho sim, mas um ratinho especial: eu sou um ratinho burro. Um ratinho que demora a aprender as normas de reforço e punição na vida. Um ratinho que demorou um pouco mais que o necessário a distinguir reforço de punição e vice-versa.
É bom saber da burrice deste ratinho, pois isso me poupa de ir buscar na psicanálise, e em todos os seus termos que só se explicam a si mesmos, o que me causa sofrimento. Pois o que me causa sofrimento é isso de não compreender e, portanto, de não conseguir me orientar nos prazeres da vida, pois não os conheço. Se agora mesmo que fiquei em casa, sozinho, compondo uma bela cena romântica de um rapaz solitário em pleno e completo 2005, cena, dessas que, sempre lindas, componho sobre meu ser, e sempre as faço também para mim, o que me soa estupidez (isso de fazer “videoclipe” dramático para si mesmo). Fico eu em casa tocando um violão sozinho, e penso no quê disso e nas causas desses movimentos tão insalubres quanto entediantes. Se ainda houvesse um Deus que de lá aplaudisse e jogasse moedinhas. Eu que insisto em olhar pra sua janela sabendo que a ultima vez que tu apareceu lá nós ainda tirávamos a roupa na mesma hora e no mesmo local. Tudo compõe um belo quadro de um rapaz angustiado e sozinho que espera uma princesa que o liberte do seu mundo cruel. E se já achava patético pessoas que compõe cenas estúpidas para outras pessoas, esses atores de teatro, penso que o que faço é ainda pior, pois sendo ateu e pragmático, não faz o menor sentido fazer coisas que outras não vejam... Mas eu sou todo esse jogo de lindas cenas de um rapaz interessante que espera uma triste dama.
O ratinho burro fica em casa, mas ao menos tira uma lição, a lição de que não vale a pena sair de casa no sábado. Um dia de aprendizado na vida desse rato. Só sei que tenho 22 e logo terei 34 e nada haverá de ter mudado, talvez a cor da parede. O rato burro permanece atado a suas teorias e a vida nada ensina a ele. O rato inteligente tudo aprende e haja certo, ganhando ao fim da sessão uma gota de água. Mas isso que digo, com esse tom de incompreensão também só serve pra compor mais esse número, que é o do artista que ninguém entende, o solitário que vaga moribundo na vida, e que reclama de tudo e todos, pois o mundo é triste e feio e ele é lindo e maravilhoso. E se a ele for dado ler Nietzsche haverá então formado um grande babaca prolixo e sedutor que com palavras galanteadoras arrasta toda a vida pra dentro do buraco, pois se recusa a ligar praquela menina. Esse aí vai depois de escrever isso aqui, ficar um pouco triste, não irá chorar e dormirá abraçado ao travesseiro, única coisa que ama.
O rato burro se aperceberá - depois de muito mais tempo que o necessário para se aperceber dessas coisas da vida - que sair às sextas-feiras também não lhe proporciona ganhos de afeto, ternura nem liberação de neurotransmissores. Por isso, o rato burro - num momento de inspiração- não sairá de casa na sexta feira. Nunca mais. Ele prossegue impiedoso na sua imensa descoberta do mundo, tanto interno quanto externo, e vê que, de fato, nenhuma de suas ações se reforçavam, nada do que faz, fará ou faria constitui algum sentido para que fosse feito novamente. Tomar suco, dançar, trepar, tomar banho de cachoeira, fazer um piquenique, andar de ônibus, tomar café, ir à Dinamarca, ver um filme e sorrir; nada disso dava ao nosso jovem e pessimista roedor alegria ou satisfação em existir; e como o nosso amigo só realizava essas ações que se mostravam reforçadoras, e como elas subitamente não mais existiam, ele nada mais faria, nada...Isso seria o apogeu; o apogeu para o qual ele caminhava. Nada. Aos poucos deixava de fazer todas aquelas ações que nunca fizeram ao rapaz bem nenhum, além de gastar importantes reservas energéticas.
Entre o outono e o inverno o rato burro morreu, morreu deitado em sua cama e nunca mais gastou energia indevidamente.
Causa mortis: Condicionamento operante.

1 comment:

Anonymous said...

O texto é um pouco averso ao que eu penso sobre morrer jovem(mas é bom!!!), o que eu realmente queria era viver o estremo da vida e morrer assim sem mais nem menos, pra não ter que lamentar e chorar por estar velha e não poder fazer o que enquando estou nova.