Wednesday, March 28, 2007

NOSSA BREVE, FRÁGIL, CONTINGENTE E TÃO GRANDE VIDA

Esse poema perseguiu meus olhos e ouvidos.
Meu padrasto (que era sim lindo, apesar dessa palavra tão feia)
dizia esses versos com propriedade e lágrimas verdadeiras.
Meus olhos acharam esses versos numa aula enfadonha e claustrofóbica
nos idos de 98.
Mostrei a uma menina que imaginava que ela também achava

aquelas aulas (e porque não aquela vida) enfadonha e claustrofóbica. Ela gostou.

Cântico negro
José Régio


"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

Saturday, March 24, 2007

NOTAS DO INTERIOR I

Psicologia deve entender a cabeça das pessoas? Não sei. Acho que o importante são as formas de fluidez verbal. Algumas palavras são diques. Represam e interrompem o caminho, barram o transcorrer, as representações, conexões. “Anarquia”, “comunismo”, “violência”, “ateísmo”. Às vezes só sobra trovão e barulho, de idéia não fica nada. Hoje, aqui em Morada Nova de Minas, percebi que talvez seja preciso agir como espião. Eliminar palavras diques do caminho que liga a utopia sonhada à realidade miserável por mais imaginária que seja, mas dolorosamente vivida. Pensamento x Acomodação; Liberdade e igualdade x competição e o último que se foda. O problema é na transição, na transposição. Quando se comunicar, buscar entender pessoas e idéias diferentes, e fazendo isso escapar das palavras diques, por mais que elas encurtariam trajetos; problema é continuar sabendo de que lado se é, não se perder e acabar se formando nas concessões, na evitação dessas palavras diques. Tenho muito medo, dos discursos oficiais, do “politicamente correto”. Procede-se de maneira a afastar o fenômeno, como se pudesse manter a tal essência inalterada.

:..:..

Se agarrar as coisas que flutuam no mar de merda do lado de lá, mas se saber do lado de cá. Do lado de lá, no campo inimigo, chegar com o corpo de merda, ir no ventilador no país das utopias alegres, dos que vivem sem angustia e que pisam na merda, mas simplesmente se acomodaram nessa situação de classe fácil e privilegiada, apesar de também serem contra esses porcos capitalistas. Não às utopias alegres, não aos sem angustia, nada de vida leve.

Tuesday, March 13, 2007

Memórias de Minhas Putas Tristes

“Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era prêmio merecidos de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para oculta a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligencia; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cólera reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado de alma e sim um signo do zodíaco. (...) O sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança.” P. 74-79

Saturday, March 03, 2007

Retomar obsessões perdidas no desanimo

Demorar 17 minutos para passar manteiga no pão

Não negar uma companhia para bar

E assim respeitar mais os bares.