Tuesday, May 31, 2005

Morrer jovem

Quero morrer jovem. Descobri isso outro dia, quando vi a noticia do assassinato da menina Gabriela lá no Rio. Fiquei triste, mas de forma alguma surpreso. Todo dia, quando me levanto, penso que talvez não retorne pra casa. Encontrar um moleque cheirando cola por aí querendo meter a faca em alguém, é mais comum do que se pensa.
Nada disso, no entanto me impede de sair à rua pra ver os carros passando todo dia. Se eu ficar velho quero ser desses velhinhos que levam os netos pro parque, e ficam dando comida pros pombos e observando os casais trocando caricias, lembrando de alguém que talvez eu ainda não conheça. Gosto de viver a vida dos outros, mais do que viver a minha própria. Voltando ao inicio desse texto, eu disse que queria morrer jovem e agora vou explicar melhor. Quando da morte da menina, um enorme rebuliço tomou conta da mídia, e de todas as frases ditas pelos pais, amigos e autoridades, uma saltou aos meus olhos: “...ela tinha um futuro brilhante pela frente”. Todos disseram isso. É por esse motivo que quero morrer jovem, quero que todos digam que eu teria um futuro brilhante, que eu seria um excelente trabalhador, marido, pai de família. Não quero ter que viver meus próprios fracassos; eu quero a moleza de, mesmo no mundo da imaginação, ter sido o melhor dentre todas as possibilidades. O interessante de se morrer jovem é que todos constroem uma vida perfeita para o defunto, não há mais drogados, futuras prostitutas, fracassados ambulante todos os mortos teriam sido dotados de um futuro de luz e alegria. A vida é um pouco mais complicada que isso. Imagino meus amigos e familiares lendo meus textos e dizendo entre soluços e lagrimas o quanto o Brasil perdeu na minha pessoa, o quanto a vida ficou mais triste com minha partida. E quero todos chorando. Acho que para que isso ocorra devo morrer até os 24 anos, ainda estudante, ainda podendo me dar ao luxo de vadiar sem ser tachado de vagabundo, fracassado. Que todos digam o quanto eu fui o melhor em tudo , o quanto era o mais engraçado, o quanto era querido , que me digam tudo isso nos seus sonhos, já que nunca me disseram quando vivo, embora eu sempre soubesse.

Thursday, May 26, 2005

Morro sempre

Morro mais em seu beijo ausente do que na bala que alguém cravou no meu peito.
Mais na mão que solta a minha do que nessa doença incurável que me apodrece
Morro mais todo dia do que nesse único no qual irei em definitivo ao cemitério
Não ligo para essa bomba no meu peito que faz circular esse liquido vermelho
Do vermelho só gosto do seu rosto quando voce imersa em vinho ou quando nervosa
E do coração só me lembro dele quando te vejo e ele cisma em perder o controle, que nunca teve
Estúpida maquina humana, estúpido funcionamento que muitos chamam de vida, quando deveriam chamar de manutenção maquinal
Essa vida com “v” pequeno que consiste na odiosa máquina continuar em movimento
Apenas um pré-requisito básico para que algo possa ocorrer
Nada de chamar esse funcionamento bobo e fácil de Vida, com o “v” grande
A valorização desse mecanismo tão tolo desvaloriza a Vida que importa
E é por isso que só posso morrer nessa Vida com “v” grande, a outra morte não me importa
Mas se morro tanto nos seus beijos ausentes, nos teus carinhos de outros tempos, em sua nudez já e agora castigada pelo funcionamento maquinal como me preocupar com uma máquina
Mas dirão alguns que é a “vida” pequena que possibilita a outra grande
Sim direi eu, mas não há como se lembrar de uma pensando na outra
A vida que me importa é essa de acordar triste e sozinho em uma cama gostosa
A vida que não me importa é a de ocupar um espaço geográfico
Só desejo ocupar um espaço em desejos alheios
Que se lembrem de mim, já amei uma vez. Já me basta.
Morro todo dia, morro na menina que só quer um celular novo , morro mais na moça triste, mas ainda mais naquela muito alegre, que ao contrário da triste, ainda não percebeu o tamanho do problema.
Minha morte só é intervalada por goles de café, sorrisos femininos, palavras de Rubem Braga, pensamentos de Nietzsche, observações de Vinicius, navalhadas de Machado, lembranças de uma mulher nua, tentativas de alegria, futebol e cerveja.
A morte cessa nesses momentos a Vida ameaça surgir e a morte recomeça, e assim nós vamos indo, sempre morrendo, até que as mortes um dia coincidirão.
E a máquina pára.
Rafa Prós

Sunday, May 22, 2005

Julinha...

Rafael Prosdocimi

Ontem eu disse a uma moça que talvez escrevesse sobre ela. Nada que chegue a ter encontrado acesso a tão formoso sistema límbico. A informação deve ter sido catalogado como “mais uma cantada idiota que ouço nesse dia frio”. Tudo bem, ela não se lembrou de mim do outro dia quando fiquei observando a distancia sua beleza e seu encanto. Ela é linda. Dessas que me fazem perder o rumo, que por sinal eu já não tenho há muito tempo. A abordagem foi no mínimo medíocre, a fase intermediária também, então desisti prontamente de prosseguir naquela comédia de erros que definitivamente não levaria a lugar nenhum, pelo menos não há lugares tipo, cama, mesa e banho. Às vezes é sadio parar o jogo e dizer que não dá pra brincar mais. Mas a verdade é que ela sem dúvida esconde um mistério. Outra verdade, é que todas as mulheres escondem seus mistérios, aquelas coisas que elas nos falam na cama, nuas, aquelas coisas que agente ouve e responde com “unhums” meio preguiçoso e que não registramos, nem mesmo entendemos. Mas o mistério dela me parece mais interessante que das demais. Ou pelo menos ela finge melhor que tem um mistério interessante. Ela é dessas que às vezes chora na cama, uma mulher que quer ir para fora daqui, como muitas outras e outros. “Deixe-me ir preciso andar vou por ai a procurar, sorrir pra não chorar”. Acho que ela talvez precisa se encontrar.
Eu a vi meio a distancia. A verdade é que eu devo estar cheirando a desespero. Desespero por um beijo, um abraço, um encostar de corpo. Uma palavra idiota de carinho. Ela deve olhar para mim e ver esse desespero. Mas no fundo ela é de outra divisão, outro departamento, não muito acessível ao meu. Tipo eu sou o Madureira e ela o Real Madrid.
Já tinha desistido de qualquer coisa com aquela moça, mas ela poderia ter feito o favor de sair do meu campo de vista. Sumir de preferência. A imagem dela era demasiado torturante, era como se um sargentinho rabugento entrasse na minha mente e gritasse para a minha já atordoada cabeça: “Incompetente, estúpido, fracassado...rápido 10 flexões de braço”. Era como se ela ali tão linda ao alcance de minhas mãos fizessem perceber que possibilidades nada significam, e que ela com certeza iria embora e o idiota aqui também. O pensamento mais torturante do meu dia: “Nunca mais verei esta menina”. Acho que foi essa a conclusão, temos às vezes uma oportunidade única de realizar certas coisas. Como um cruzamento na área quando o atacante tem que pular para cabecear a bola no momento certo, passado esse momento, não haverá outros e o jogo ficará perdido.
Foi o que aconteceu, o jogo acabou. Sem mesmo ter começado. Um time tremeu muito antes da partida. Todos os jogadores passaram mal. O outro time mandou avisar que se recusa a jogar com um time de covardes. Que eles voltem para a 3a divisão. Não merecem este estádio, os torcedores e tão formosa adversária.

Thursday, May 19, 2005

Metafísico aos três

Rafael Prosdocimi
O menino andava naquela manhã de sábado, sendo que na verdade esse último nome ele não entendia muito bem ainda não, e dizia “chábdo” repetindo mamãe; mas só sabia que havia dias que seu pai o pegava e o levava pra passear, os adultos chamavam esses dias de sábado, o que ele aprenderia mais tarde, com facilidade. Gostava muito desses dias de passeio naquela praça sempre cheia. O garoto gostava ainda mais de ir com seu velotrol pra longe de papai e de mamãe, e nessa distancia se colocar a ver as coisas ao redor. Um contemplativo. Ficava olhando ao redor as cores, as formas, os tamanhos e ficava encantado com algumas coisas e não com outras, o que de forma alguma o fazia pensar no porquê de sua felicidade, era uma contemplação profundamente material, mas, sobretudo e, principalmente, desinteressada na suas causas intrínsecas ou extrínsecas de ser. O menino nunca se colocaria a pensar coisas que a vida não dispunha para que ele pensasse. Nisso sua atenção, seu interesse na vida era genuíno, tudo era um pouco novo e qualquer coisa diferente que aparecia na frente dos seus olhos produzia algum sentimento. E o menino agora longe dos pais, andava pela praça, andava com seus cabelos cacheados e compridos, andava lentamente no seu veículo, e de vez em quando parava e olhava algo por bastante tempo. Olhava um carro de policia, uma moça de cabelo cor de amarelo com um outro menino no colo, um rapaz sem tênis. Era um garotinho especial e fazia da vida algo belo só de ficar parado olhando. Tinha esse ar dos filósofos, mas sem a impertinência e arrogância, não se perguntava ainda, felizmente, se o que ele via com toda encanto e beleza, se isso tudo que era maravilhoso, era algo que só a ele era mostrado ou mesmo revelado; sendo que a dúvida de todo mundo pensar o mesmo que ele, ou não, pouco o interessava, pois não existia.
Num determinado momento o menino parou e olhou pra cima e de sua face surgiu algo tão belo, tão espontâneo, um sorriso tão aberto e honesto, um sorriso que comporia resposta a muitos dos problemas existenciais de seu pai, se ele estivesse por perto. O menino ficou aí parado olhando pra cima, sorrindo. Foi aí que uma dona surgiu e viu naquele rosto lindo tanta luz e brilho que quis ver o que o menino via também, e assim como ele, sorrir sem motivo, sem motivo de se precisar sorrir por dinheiro ou por outra pessoa mesmo. Ela olhou na direção daquilo que o menino via, e achou primeiro estranho, e depois pensou que o menino era burro, pois só viu uma placa de transito, uma que dizia PARE.
É menino, por favor, continue procurando algo belo e se entusiasme por essas coisas. Que você seja sempre lindo e implacável com a preguiça, que a beleza da vida o mantenha assim, desse jeito que te vi ontem pela manhã. Que você seja feliz num mundo belo, que você seja esperto e ágil com os estímulos, e que continue se encantando e sorrindo sozinho, desejo ainda mais que você suporte tudo e todos, pois eles sempre o chamarão de louco pela vida a fora.

Wednesday, May 04, 2005

A mãe da velha que não se chamava Francisca

Rafael Prosdocimi

Olhou a filha ao lado da cama e se lembrou de quando a menina nasceu. O pai disse que se chamaria Francisca, “para lembrar de titia querida”; mas a mulher sabia quem era a Francisca mencionada. Afamigerada concubina, oficial, até mesmo dentro do esquema organizacional de despesa da casa, mas que até mesmo naquele dia, a lembranca dessa mulher, anos depois da morte de seu amado marido, só se prestava a machucar o coração, pequeno, dessa nobre senhora.
O coração pequeno agora estava velho e cansado, indisposto a suas ações tão rotineiras e monótonas, e se confundia todo entre contrair e expandir; confusão que fazia aquela filha, a não-Francisca, estremecer toda quando a mãe sentia uma dor no peito. “Pouco esforço” disse o médico, esse é o único remédio. “Mas pouco esforço pra viver ou pra morrer” se indagava a senhora.
Dona Geralda nem sempre fora dona, mas o “Geralda” o acompanhou por todos os momentos, e ela, nessa cama de hospital, se lembrava com doçura como cada pessoa de sua vida a chamava diferente. Pra ela parecia que cada pessoa tem uma necessidade muito forte de colocar sua marca em tudo, inclusive naquilo que é o mais comum e ordinário de tudo na vida, o nome das pessoas. O pai só a chamava de Geraldinha, e ela só gostava desse chamado na voz dele, ninguém mais se atrevesse a chamá-la assim. Pra mãe era dindinha assim como para os irmãos. Pensando nisso lembrou do pai morto há tanto tempo. Pensou que hoje se vive demais, há muitas coisas que atrapalham e prolongam as coisas. Tubos e maquinas que impedem a uma pessoa simples de uma morte banal e humilde, ficando todo mundo agora a esperar não o silencio da voz, do coração, mas sim que esse “tu, tu, tu”, dessa maquinaria horrorosa pare de soar. Pensou que queria muito morrer em casa, talvez falasse com a filha pela manhã. Esse pensamento veio como as vezes a gente vê uma formiga vindo. O pensamento veio e nem um mísero sentimento provocou.
Dona Geralda olhou a filha que dormia e viu no rosto dela que ela nunca teria sido uma Francisca. Não havia nada de Francisca. A filha a acompanhava nesse quarto de hospital, esse quarto tão ruim como todos os quartos de hospital. Sabia que a filha sofria, mas nossa senhora sabia que a vida acabava, e sabia disso com uma honestidade que faltava a muita gente. Percebeu nesse momento que usava fralda e que esta se encontrava suja. Não havia percebido. Um arrepio percorreu seu corpo, seguido pelo segundo mais brutal nojo de si-mesma que já havia sentido na vida, só perdendo para sua primeira noite de amor. Acordou a filha de sobressalto, não ousava ficar suja nessa idade. A morte já tinha sido combinada e com relação a isso essa honesta mulher não ousava discutir, mas agora isso de ficar de fralda e ainda mais suja...ah... isso era um abuso.
A filha acordou assustada já que se encontrava sempre pronta pra chorar e ligar pra muita gente a qualquer instante. Mas a mãe, menos emotiva e metafisica, só pensava em se limpar. A filha, que também colecionava décadas, assustou com o pedido da mãe de tomar banho àquela hora. Era madrugada e só as duas estavam naquele quarto. Ela nunca conseguiria carregar a mãe, não que se precisasse de tanto, a mãe andava, mas a verdade é que seria perigoso e, além disso, nossa filósofa octogenária acreditou nessa desculpa e, mesmo suja, se resignou. O resto da madrugada foi de tormento, praquela já torturada pessoa. Uma mulher sempre tão asseada agora sujeita a todas essas sujeiras em contato com a sua murcha pele. A higiene, coisa tão preciosa para essa senhora, fora desrespeitada e isso a incomodava como o maior dos suplícios. Ela armaria um escândalo à madrugada daquele lugar tão calmo a essa hora. Armava brigar com tudo e todos pelo seu direito inalienável a água e sabão, algo que até os presos possuíam, pensava. Pra essa senhora a sujeira era uma das faces do demônio. E por assim dizer, a face mais feia .
Olhou o relógio na parede, eram 4 horas. Frente às reclamações maternas, a filha disse que quando a enfermeira chegasse o banho seria providenciado. Isso aconteceria às 7 horas da manhã. Essa informação indicava 180 minutos de sofrimento. Seu pobre, antigo e pequeno coração entendia esse sofrimento, e frente ao problema real, fecal e imediato se sentia no dever – se nada podia fazer contra a falta do banho- de não atrapalhar o coreto, e se mantinha impassível, simples, coadjuvante e necessário como um pandeiro compassado na roda de samba.
Antes da enfermeira chegar, a empregada do sitio chegou ao hospital. A filha já idosa, e agora, além dos outros cansaços, sentia também o de não dormir, necessitava de um pouco de sono. A mãe tentou permanecer calma. O banho estava próximo. Sabia que não podia ir suja ao encontro. Só pensava em um banho, sua única meta. E foi às 7 que a enfermeira entrou no quarto e a levou pro banho. As 7 e meia voltou pra cama, limpa, cheirosa e seca e aí veio a imagem do marido, que apesar de cachorro e alcoólatra, a cheirava, quando ela saia do banho, de um jeito que a fazia subir ao reino do senhor, pelo elevador de serviço, por assim dizer, mas sempre com muita culpa, é bem verdade. Lembrou desse homem tão triste e fundamental em sua vida.
Nessa hora, agora limpa e sem sentir nenhum incômodo, a mulher deitou na cama e morreu.

Tuesday, May 03, 2005

Duas verdades

"Venho por meio deste documento informar duas verdades. Não fora deus que teria enviado essas verdades, nem mesmo o diabo, para aqueles que se exaltam ao ver o nome Dele escrito em letras pequenas. Antes de ateu eu sou um anarquista e gosto de abolir as formalidades, ou não, já que se considerar que irei abolir todas as formalidades isso é em si uma regra, logo uma fórmula, mais uma formalidade. Sendo assim posso escrever o seu Nome com letras grandes ou pequenas. Bobagens e masturbações gramático-filo-teologicas à parte, essas verdades, as quais pretendo logo revelar, me soam verdadeiras e é só isso.
Nada mais me diz que elas são verdades irrefutáveis, mas Eu penso que são verdades e até mesmo você acha que é verdade, pois se vossa senhoria não assumir que o que escrevo seja verdade, é melhor que eu pare de brincar com você, pois essa história não terá a menor graça. É como aquela menininha que quando brincávamos de médico e paciente e pedíamos para examiná-la, ela se virava e pedia CRM, diploma, estetoscópio.
Essas verdades estão relacionadas com o sistema de conquista desenvolvido em nossa sociedade. A primeira verdade é que TODA MULHER É MULHER DE MALANDRO. Bem, espero que as feministas estejam todas bravinhas, dando ataques histéricos, daquele jeito que elas ficam ainda mais lindas. Adoro as feministas. A maneira como elas se levam a sério, implicadas no problema, a espera de qualquer um que chame a história da espécie humana como a história do Homem, e como se exaltam e querem mudar o mundo por causa disso é simplesmente um charme. Essas mulheres de fato são admiráveis e eu, que sou terrivelmente abalado por bailarinas, nadadoras e tocadoras de violão, sou genuinamente abalado por fêmeas feministas. Essas que brigam a toda hora, menos por questões filosóficas e mais por gostarem de uma boa briga. Eu também sou desses que adoro uma bela briga, ainda mais uma briga que começa em qualquer lugar e termina na cama, palco ideal para se brigar com uma feminista. O ímpeto com que essas desenrolam seus argumentos na fala é o mesmo com que elas nos atacam e mordem. Nada como uma boa briga. E essas mulheres que não são briguentas, que são muito apáticas, nos ouvem como quem ouve Deus, obedecem aos nossos desejos muito prontamente, querem agradar demais quando um desagrado seria muito mais interessante. Mas mesmo com meu interesse genuíno em feministas eu ainda declaro a validade da primeira verdade. E quando digo TODA MULHER É MULHER DE MALANDRO, digo todas, ou seja, não há exceção. A mulher é realmente esse ser que veio a Terra nos adornar, nos adorar e nos amar, isso como função principal, como meta de vida, sendo elas costureiras, professoras, astronautas ou mesmo geneticistas. Sendo assim, toda biografia feminina (pelo menos as interessantes) deve ter seu ponto alto em alguma paixão. A primeira verdade está dita, escrita, contada, impressa em sua mente, te incomodando.
A segunda verdade, no entanto, tira um pouco da força da primeira. Essa frase é de um importante intelectual brasileiro que diz : “MALANDRO É MALANDRO E MANÉ É MANÉ”. Ou seja, nem todo homem é malandro. Simplificando ainda mais, há mais manes do que malandros, o que de fato propicia que a primeira verdade soe como mentira, mas o fato que é fato é que se todos os homens fossem malandros todas as mulheres seriam submissas (ainda mais). Todo leão é passível de ser domado, embora eu não saiba como o fazer. Substituindo mulher por leão e homem por domador. “TODO LEÃO PODE SER DOMADO, MAS NEM TODO HOMEM É UM DOMADOR”. A mulher que manda no marido apenas tenta reverter o quadro, mas ela já se sabe falha, pois o malandro não so engana, ele também encanta. O mané não manda, mas também não te dá paixão, gozo, sorrisos. Há de se escolher, sabendo que como diz a segunda verdade, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Não tente adaptar seu manezão e nem amansar o malandro que tens em casa. Podes até tentar, já que de fato tentar algo, é o que mais fazemos na vida, mas saiba que é uma tentativa vã.
A conclusão seria que toda feminista é uma mulher que não encontrou ainda seu malandro, e o que é mais triste, já desistiu de encontrar, e é por isso que ela gasta toda a sua energia, que não é gasta na cama, nessa verborragia sem fim, e por isso que há tanta paixão nessas moças. E no fundo elas têm tanta raiva dessa primeira verdade que com veemência a negam, mas o fazem em voz alta, porque no silencio de suas vidas sabem ser verdade aquilo que digo verdade."
Antonio Tomassi

Sunday, May 01, 2005

Um dia bão

Rafael Prosdocimi

Começo o dia com a preguiça daquele que vê, que não fora um bom negócio ter marcado aquela pelada pras nove horas de um sábado de ressaca. Acordo, tomo um café rápido, ligo pra dois amigos que foram mais preguiçosos que eu e não vão ao futebol e vou a quadra.
Na quadra, dos dez necessários havia só 6. O que não abre possibilidade de um jogo. Na quadra ao lado a mesma coisa...As pessoas acordam todos os dias 6 horas da manhã, pegam ônibus, vão estudar, trabalhar e amar coisas que não gostam, e quando vem o futebol, o derradeiro, essas pessoas preferem ficar em casa babando no travesseiro. Digo aos amigos da quadra ao lado que joguem conosco, pois senão ninguém jogaria. Um colega meu diz pra fazermos um amistoso. Nós contra eles.Começamos marcando gols, jogando fácil, mas depois de estar ganhando por 14 a 8, os caras da quadra ao lado, começam a freneticamente fazer gols e empatam a partida. 14 a 14 e então combinamos que quem fizesse o gol seguinte ganharia o jogo, a não ser que alguém morresse antes em campo. Ganhamos.
Do dinheiro pago por todos para o aluguel da quadra, sobram 1,40. Vou a padaria ávido por um suco, ou algo que refresque a hora e os minutos de correr embaixo do sol. Lá chegando, descubro o quão caro são esses sucos. No preço exorbitante do suco acabo comprando uma cerveja. A melhor cerveja da Vida. Saio andando pra casa e tenho a sensação de que o futebol permanece como as batalhas que antigamente travávamos, das lutas por domínio, por poder, das flechas e espadas. O sentimento de general vencedor, o corpo gostosamente cansado. Essa disputa, o despejo de toda essa raiva que timidamente colecionamos nos trânsitos por aí. Todo esse tédio deságua no sábado pela manhã, no futebol. Saí como herói da guerra, cansado e feliz, como quero muito sair do dia pra noite, aí pro sonho e mais tarde sair da vida. O cansaço é essencial. O corpo dói, demora a responder. Se o sangue, jorrado da batalha de um tempo antigo, é sublimado nesse jogo, o corpo, a dor, a dilaceração física permanece bruta, intacta. E definitivamente é necessário o futebol pra começar um dia bão.
E foi assim, foi nesse momento que saí do jogo, comprei uma cerveja, a cerveja, essa que é essencial, essa que vem depois do futebol como quem diz, “é meu amigo eu vim pra ficar”. Foi aí que percebi o belo dia. Foi aí que fui pra casa.
Escrevi bem, escrevi coisas que precisavam ser escritas, coisas sérias. E no mais fiquei em casa a curtir um sábado de ficar sozinho em casa. À noite havia combinado de sair com uma amiga, e mais amigos. Sendo que a primeira se diferencia das outras pelo grau de acesso que ando liberando, a essa “senhorita”, da minha humilde mas portentosa subjetividade. Os poetas dizem muito de amizade e tudo mais, mas pra mim a amizade é essa que permite dizer coisas, todas as coisas, filtrar pouco, muito pouco, um bom amigo é nesse sentido, alguém que muda algumas coisas na nossa cabeça porque tem acesso a ela. Nessa saída não esperava nada demais. Como não espero nada demais da vida. O que é uma pena. O fracasso me venceu. Foi na porta que a vi chegar, ela com os cabelos mais longos do que da última vez que a vi, cabelos que não vi crescer, infelizmente, esses cabelos que tampavam as costas tão lindas, e tão nua. Ela que tenta não seduzir muito, nesse jeitinho de ser e de falar coisas como “véio” e “qualé” quebrando qualquer alusão a princesas e coisas abstratas, acabou que não conseguiu segurar essa sua beleza simples, esse seu olhar castanho, que cisma em ficar saindo do meu, como se isso fosse permitido, não, não é. A tranqüilidade desse seu olhar me faz falta todo dia. Sinto aquela coisa difícil num mundo de muito gente e muitos olhos aquela coisa de chegar em casa. Feche a porta. Quero deitar. To cansado.
E fui eu que fiz o nosso gol da vitória.

Né?

“De um exame de doutorado- Qual é o objeto de toda instrução superior? – Converter o homem numa máquina. Que meios devem ser empregados para isso? Ensinar o homem a aborrecer-se. Como se consegue isso? Com a noção de dever. Que modelo se deve propor? O filólogo, que ensina a trabalhar sem descanso. Qual é o homem perfeito? O Funcionário do estado. Qual é a filosofia que fornece a formula superior ao funcionário do Estado? A de Kant; o funcionário como coisa em si, colocado sobre o funcionário como aparência.”
“O verme se retrai quando é pisado. Isso indica sabedoria. Dessa forma ele reduz a chance de ser pisado de novo. Na linguagem da moral: a humildade.” P.13