Thursday, December 28, 2006

ARGUMENTO

A discussão entre o que diferencia “ciência de verdade”, mito, religião, pseudociência, ciências humanas, e o escambau, sempre me interessou profundamente. Ao longo de minha vida esse interesse ressurge e é declinado por razões, motivos e interesses diversos. Isso desde quando ainda sonhava em ser um físico charmoso de óculos, descobridor dos segredos finais do universo (assim como das mulheres). Lia Sagan convencido de que nunca haveria um dragão invisível, a-térmico e imaterial na minha garagem. E convencia-me de que saber da inexistência inexorável do tal dragão era importante e me protegia da farsa e da enganação. Havia o mito e a religião a serem combatidas. E a briga era essa. Ou se explicava o mundo de forma mítica ou de forma cientifica. Eu achava fantástico isso tudo e interessava-me por todos esses grandes divulgadores da ciência.

Na física não fui nem mesmo um sopro. A mudança pensada, ainda em tempo de colégio, para a psicologia procedeu-se em apenas 6 meses. Havia tanto fetiche em querer ser físico que sobrava pouco interesse em debruçar a vida inteira sobre dados insossos, vazios, elementares, buscando explicação da natureza das coisas. No meu narcisismo (palavra que aprenderia mais tarde) não conseguia me ver como um encadeamento de coisas que aconteceriam mesmo se eu não existisse. Havia um idealismo além da “minha” conta em achar que EU contribuiria para o progresso da ciência. Meu egoísmo, particularismo, imediatismo e holismo me impediram de seguir esse caminho; assim como minha preguiça mental, minha burrice, meu desânimo. Desistindo de estudar átomos, resolvi tornar-me um. Sem nem mesmo saber o que fazia entrei para o curso de psicologia, e de lá para a pesquisa social foi um pulo. O interesse cientifico na organização da sociedade aconteceu sem nem mesmo saber o que fazia. Uma paixão mesmo talvez. Portanto, desde o inicio do meu curso me dedico ao estudo de processos psicossociais, e me inscrevo dentre daqueles que trabalham com ciências humanas. Nunca fiz análise ou terapia, nem nunca trabalhei com isso. Leio Cyro dos Anjos e Rubem Braga convivendo e sofrendo com meus porões e suas coisas pobres e sujas. Minhas mentiras guardadas e a covardia dos gestos amarelados em lembranças.

Mas agora a ponta que retorna da eterna discussão é a relação entre as ciências humanas e as ciências naturais. Continuo debatendo isso principalmente com o Chico, com a feliz interlocução de um ou outro (Gabriela, Rodrigo, Thiago). E quando disse para umas amigas psicanalistas, que andava discutindo essas coisas com meus amigos “cientistas de verdade”, elas ainda me fizeram troça e perguntaram o que eu ainda queria com essa discussão, deixando claro que seria essa uma questão sem fim e sem ponto de discussão. Bom, elas não disseram nessas palavras, mas creio que era isso que queriam dizer. E aí parei para pensar no porquê de todo esse barulho. Afinal está tudo certo. Os cientistas naturais pensam que a gente faz filosofia, má literatura ou somos uns revolucionários frustrados; e nós pensamos que eles são uns alienados, escravos da linha de produção taylorista-fordista do pensamento, ou ainda que cansados de matar Deus (que já perdeu toda a graça) resolveram também matar o sujeito, o ser humano e proclamar a cegueira do relojoeiro, da máquina da vida ou da dança do universo, e porque não também da sociedade. A sociedade com leis naturais não dependeria nem de psicólogos ou sociólogos e sim de físicos, biólogos e matemáticos. Não concordo com nada disso. E pensando, portanto, no porquê de toda essa discussão, cheguei à conclusão que eu me embrenhava nessa briga menos para provar porque as ciências sociais são indispensáveis e fundamentais para o conhecimento humano, e mais para compreender melhor meu objeto de estudo. Também para combater a leva de cientistas naturais que cansados de suas perspectivas atomísticas e minimalistas se colocam a transpor de um nível do conhecimento para o outro em salto, sem pensar nas mediações e interações que diferenciam sociedade de individuo. Como alguns físicos que querem demonstrar a indissociável ligação entre as “novas” descobertas da mecânica quântica às questões da existência e experiência humana, assim como os psicólogos evolucionistas que querem explicar porque o homem “pula a cerca” unicamente devido ao maior ou menor investimento parental; ou mesmo quando Sr. Dawkins procura mostrar que as idéias pulam de cabeça em cabeça da mesma forma que os genes se propagam na natureza. Todas essas teorias toscamente esboçadas aqui, partem do principio de que descobertas num nível elementar, subatômico ou biológico se aplicam 1 a 1 ao ser humano e à sociedade. Como se as respostas as perguntas da sociedade fossem essas que eles querem nos dar. Nós queremos menos descobrir se há ou não um gene da homossexualidade e mais porque investimos tanto dinheiro e tempo em descobrir um gene da homossexualidade. Pensamos que a saúde da sociedade depende mais de nos havermos com o preconceito e a discriminação, do que com a determinação da homossexualidade. Que haja uma determinação genética é algo que não negamos ou rechaçamos como explicação causal. Compreendemos dentro de um feixe de considerações. Mas não é essa a pergunta que fazemos. Perguntamos porque o homossexual incomoda tanto a sociedade, os valores, a “ética”.

Penso que é porque o objeto de estudo das ciências humanas não se encontra, para os “cientistas de verdade”, claramente demonstrado que eles persistem na posição de considerar que há um substrato natural (no sentido de estrutura) que determinar formas de ser, e que a cultura (ou a sociedade) entra como algo de menor valor nessa equação. Fieis aos princípios da universalidade e da homogeneidade, resolvem o problema do particular, não como um problema, mas como uma exceção extirpada, ou como uma questão de resíduo estatístico.

Então o melhor motivo que tenho para continuar nessa discussão por mais que ela me canse por vezes, é a possibilidade de repensar, reconstruir o nosso objeto de estudo e demonstrá-lo de maneira mais clara. E no nosso caminho, sobressaltam diversos adversários. Não mais aqueles que se dividem em “cientistas” e “religiosos”. O que carece demonstrar é que o que estudamos (o fenômeno social) possui características que não podem ser reduzidos a elementos físico-quimico-biológicos. E é claro que nem míticos ou religiosos. Essa demonstração não deve, por outro lado, ter um caráter exclusivista e “corporativo” de que não há influência de elementos biológicos, físicos ou químicos. Uma mulher bonita continua sendo preterida (em maior parte dos lugares) a uma feia (por mais que pense que isso seja construído socialmente), e as drogas continuam a afetar o nosso corpo e seus receptores neuroquímicos.

O que reforçamos é o caráter de reflexividade e interação que constituem o ser humano, e que esse processo (interação e reflexividade) criam forma de determinação não previstas anteriormente ao próprio processo. Não previstas nem pela fisiologia, nem pela química, nem pela física. Nesse sentido as ciências humanas e sociais não podem prescindir do sentido (significado), nem da história tal qual as outras ciências fazem. Excluir o sentido da compreensão da sociedade é buscar compreender a sociedade como abstração. É ainda concluir que a sociedade é nada mais do que a soma das partes. Que compreendendo a parte se compreende o todo. Que a parte é constituída de maneira homogênea, dependendo portanto de uma constituição natural. O ser humano é natural, a sociedade é feita de seres naturais, logo a sociedade pode ser compreendida entendendo a natureza dos seres vivos. Essa resposta resolve algumas pedras no sapato no caminho do cientificismo: o antropocentrismo, o particularismo, a história, a contingência. É por isso que todos os dias rezo e agradeço a existência da antropologia. Haverá sempre uma tribo numa ilha de nome impronunciável no Pacifico a mudar nossa perspectiva.

Um átomo não representa o mundo. Uma criança sim, de que forma hoje e há 100 anos atrás cabe pesquisar e conhecer. Se a televisão mudou a linguagem das pessoas, a forma como elas interagem (ou então a Internet) não há como estabelecer apriori, sem se levar em conta como as pessoas reais reagiram à televisão ou a Internet. E obviamente vão se misturar, aos pesquisadores que querem de fato compreender como a Internet influenciou a linguagem das pessoas, outros pesquisadores que querem demonstrar como a Internet empobreceu a linguagem, e outros, bancados pelo GOOGLE, que querem deixar claro como a Internet facilitou o intercambio cultural e aumentou a solidariedade entre as pessoas. E o desafio que os “cientistas de verdade” nos fazem, nos leva a necessidade de demonstrar, por exemplo, nesse caso o que é ciência social e o que não é. O que é marketing e o que é ação política. Isso é uma das coisas que me fazem continuar a interessar por essa discussão. Precisamos compreender melhor nosso próprio objeto de pesquisa e suas relações com outros sistemas de ação humanos, arte, política, cultura, ciência. Mas não podemos como eles fazem simplesmente dizer, “olha isso aqui é ciência e ponto final, não tem nada de social não”. Não é possível, pois estamos emaranhados a sociedade e à política. E a pior forma de fazer ciência social é dizer que essa relação não existe. Não andamos nem mexemos com fatos ou coisas. A ciência social ao dizer e buscar compreender relações sociais cavalga pelo duplo caminho da ciência (no sentido de ampliação do conhecimentos) e da política (no sentido de interferir nas relações sociais).

Nesse sentido discutir com os “cientistas de verdade” continua ajudando. Eles têm a clareza do que estudam e dos processos que realizam. Afinal, as coisas continuam mais distinguíveis num laboratório. Eles não se preocupam em cada movimento, em cada instante, das conseqüências sociais e políticas dos seus atos. Eles podem blindar sua alienação com o ideal da ciência. Da busca da verdade. E a nossa alienação (dos cientistas humanos) é parte da nossa ciência. Quando vamos estudar os “pobres, feios e sujos”, carregamos nosso olhar e é ele primeiro que temos que compreender e analisar. Imaginem um físico pensando se estaria sendo preconceituoso em lidar com aquele glúon? Ou se a ação do fóton estaria sendo alterada pela minha roupa?

Nós, das ciências humanas, somos meros átomos, estudando átomos. E é isso que nos interessa, como os átomos interagem. O que determina ou não a ação de um átomo. Só que os átomos pensam, interagem e refletem. Não somos deuses olhando formigas. Somos formigas compreendendo a vida de formigas.

Wednesday, December 20, 2006

A tecnologia solidária à minha angústia

Estranho como a solidão vem ainda mais devastadora quando não posso digitar e colocar algo no meu blog. Um desabafo que seja. Sinto-me menos abandonado jogando em fios e cabos, de todos os tipos, mensagens como 1-0-0-0-0-1-1-1-1-0-1 que alguém vai traduzir como “solidão”... Estranhos tempos.

Sozinho, triste, escrevo algo e jogo na Internet sentindo-me bem, apenas pela simples idéia (que não precisa se materializar) de que alguém, em algum lugar vai se debruçar sobre o que senti e se afetar com isso...e só essa idéia me basta. Que isso seja covardia, não me importa. Mas que haja olhos (queria dizer ouvidos) atentos, sensíveis e solidários com a dor de um outro IP. É só isso que peço. E aí fica claro que a solidão é algo imaterial. É algo de saber que há uma menina (moça, mulher ou senhora) que num passado próximo, de vez em quando parava, lia minhas coisas e escrevia algo belo para mim, e depois se ia secreta e misteriosamente. E de vez em quando voltava e ficávamos brincando de esconde-esconde. Ela que eu suspeitava encontrar numa aula terça-feira, mas que podia ser também aquela da janela mais linda, com uma árvore, que nos protegia do odioso concreto armado, essa que ainda tinha um outro “Prosdocimo”, um irmão, a manter guarda e protegê-la na sua cozinha...

Ficou o mistério real. E restou esse sentimento de que eu poderia falar com todos, mas sabia que eles não me ouviriam, e então sabia também que ela sim, ela...ela em qualquer lugar do mundo sempre deixaria de fazer qualquer coisa importante que fosse, e me acharia no “fantástico mundo de blog”.

E nessas ultimas 15 linhas que passaram, já me sinto bem, compartilhando. Agradeço abertamente ao anonimato da Internet, à possibilidade sem culpa de sermos quem quisermos ser, de se falar o que se quiser falar, de se estar à vontade com suas próprias idéias e sentimentos. Não há dedos a apontar e cada um dá o que tem. E tem coisa ruim e coisa boa. Eu só me lembro das verdadeiras pessoas e de suas boas palavras.

Wednesday, December 06, 2006

FRASE DO DIA

"Um sujeito que gosta de ópera e não gosta de um samba de Cartola, da Estação Primeira do Morro de Mangueira, é um sujeito que não gosta propriamente de ópera, gosta apenas do Teatro Municipal." Rubem Braga

Monday, December 04, 2006

RIO DE JANO- "CADERNO DE VIAGENS" - (http://www.hybrazilfilmes.com/riodejano/)

Sunday, December 03, 2006

HONESTIDADE

Há uns dias falei de uma musica do Lulu Santos que fazia bastante sentido com a "minha vida" (não tenho orgulho disso, pelo amor de deus) e descobri hoje que a musica chama "minha vida".

Minha Vida

Lulu Santos

Quando eu era pequeno
Eu achava a vida chata
Como não devia ser
Os garotos da escola
Só a fim de jogar bola
E eu queria ir tocar guitarra na TV

Ai veio à adolescência
E pintou a diferença
Foi difícil de esquecer
A garota mais bonita
Também era a mais rica
Me fazia de escravo do seu bel prazer

Quando eu sair de casa
Minha mãe me disse:
Baby, você vai se arrepender
Pois o mundo lá fora
Num segundo te devora
Dito e feito
Mas eu não dei o braço a torcer

Hoje eu vendo sonhos
Ilusões de romance
Te toco, minha vida
Por um troco qualquer
É o que chamam de destino
E eu não vou lutar com isso
Que seja assim enquanto é

Pressentimento 2

Ai ardido peito quem irá entender o meu segredo. Quem irá entender o fruto secreto de minha mediocridade. Quem irá entender das escolhas que sempre deixei de fazer. Que o meu suposto desânimo pelas pessoas ao meu redor, meu discreto abandono, o que há de blasé em mim é só vontade de gente, desejo de encontro verdadeiro, de calor, de brilho...Que sempre fingi estar além das pessoas ao meu redor por estar sempre tão aquém. Desisti de tudo o que poderia não ter sido bom. Os culpados pelos meus fracassos serão os de sempre... Vejo um rapaz tocando um violão. E não sou eu. E eu que antes de tudo amo (conjugação do verbo amar) o violão. Afastei-me dele, por não encontrar o reconhecimento gratuito que sempre cobrei de meus pais. Minha maldição...O futebol que eu nunca quis jogar melhor e que poderia se assim desejasse. O texto que não quero melhorar. O violão que fingia timidez para ver se colava e deixavam-me quieto... e colava. Eu queria ser xingado, cobrado, mandado. Agora resta patetice e mulecagem.

Tenho que fazer aula de violão ...

Ou deveria fazer análise...

Fica assim:

O que for mais barato...

Friday, December 01, 2006

Musicas que valem o dia...

Pressentimento
(Elton Medeiros e Hermínio Bello de Carvalho)
ai ardido peito
quem irá entender o seu segredo
quem irá pousar em teu destino
e depois morrer de teu amor
ai mas quem virá
me pergunto a toda hora
e a resposta é o silêncio
que atravessa a madrugada
vem meu novo amor
vou deixar a casa aberta
já escuto os teus passos
procurando o meu abrigo
vem que o sol raiou
os jardins estão florindo
tudo faz pressentimento
que este é o tempo ansiado
de se ter felicidade