Saturday, April 19, 2008

Minha Metafísica



Ouvi essa canção há muito tempo. E por muito tempo. Era criança e me divertia com essa história. Porra!!! o capeta ia a missa no final, como pode?
Algum tempo depois, quando essa canção já me cercava como mito, li dentro de um ônibus, o seguinte conto.


EU E BEBU NA HORA NEUTRA DA MADRUGADA

Rubem Braga

Muitos homens, e até senhoras, já receberam a visita do Diabo, e conversaram com ele de um modo elegante e paradoxal. Centenas de escritores sem assunto inventaram uma palestra com o Diabo. Quanto a mim, o caso é diferente. Ele não entrou subitamente em meu quarto, não apareceu pelo buraco da fechadura, nem sob a luz vermelha do abajur. Passou um dia inteiro comigo. Descemos juntos o elevador, andamos pelas ruas, trabalhamos e comemos juntos.

A princípio confesso que estava um pouco inquieto. Quando fui comprar cigarros, receei que ele dirigisse algum galanteio baixo à moça da tabacaria. É uma senhorinha de olhos de garapa e cabelos castanhos muito simples, que eu conheço e me conhece, embora a gente não se cumprimente. Mas o Diabo se portou honestamente. O dia toda - era um sábado - correu sem novidade. Ele esteve ao meu lado na mesa de trabalho, no restaurante, no engraxate, no barbeiro. Eu lhe paguei o cafezinho; ele me pagou o bonde.

À tarde, eu já não o chamava de Belzebu, mas apenas de Bebu, e ele me chamava de Rubem. Nossa intimidade caminhava rapidamente, mesmo sem a gente esperar. Quando um cego nos pediu esmola, dei duzentos réis. É meu hábito, sempre dou duzentos réis. Ele deu uma prata de dois mil-réis, não sei se por veneta ou porque não tinha mais miúdo. Conversamos pouco; não havia assunto.

À noite, depois do jantar, fomos ao cinema... Outra vez me voltou a inquietude, que sentira pela manhã. Por coincidência, ele ficou sentado junto a duas mocinhas que eu conhecia vagamente, por serem amigas de uma prima que tenho no subúrbio. Temi que ele fosse inconveniente; ficaria constrangido. Vigiei-o durante a metade da fita, mas ele estava sossegado em sua cadeira; tranqüilizei-me. Foi então que reparei que ao meu lado esquerdo sentara-se uma rapariga que me pareceu bonita. Observei-a na penumbra. A sua pele era morena, e os cabelos quase crespos. Sentia a tepidez de seu corpo. Ela acompanhava a fita com muita. atenção. Lentamente, toquei o seu braço com o meu; era fácil e natural; isto sempre acontece por acaso com as pessoas que estão sentadas juntas no cinema.

Mas aquela carícia banal me encheu as velas de desejo. Suavemente, não deslizei a minha mão para a esquerda. A moça continuava olhando para pio o filme. Achei-a linda e tive a impressão de que ela sentia como eu estava me emocionado, e que isto lhe dava prazer. Mas neste momento, ouço um pequeno riso e viro-me. Bebu está do me olhando. Na verdade não está rindo; está sério. Mas em seus olhos há uma qualquer malícia. Envergonhei-me como uma criança. A fita acabou e não falamos no incidente. Eu fui para o jornal fazer o plantão da noite. Só conversamos à vontade pela madrugada. A madrugada tem uma hora neutra que há muito tempo observo. É quando passo a tarde toda trabalhando, e depois ainda trabalho até a meia-noite na redação. Estou fatigado, mas não me agrada dormir. É aí que vem, não sei como, a hora neutra. Eu e Bebu ficamos diante de uma garrafa de cerveja em um bar qualquer. Bebemos lentamente sem prazer e sem aborrecimento. Na minha cabeça havia uma vaga sensação de efervescência, alguma coisa morna, como há um pequeno peso. Isto sempre me acontece: é a madrugada, depois de um de dia de trabalheiras cacetes. Conversamos não me lembro sobre o que. Pedimos outra cerveja. Muitas vezes pedimos outra cerveja. Houve um momento em que olhei sua cara banal, seu ar de burocrata avariado, e disse: - Bebu, você não parece o Diabo. É apenas, como se costuma dizer, um pobre-diabo. Ele me fitou com seus olhos escuros e disse:

- Um pobre-diabo é um pobre Deus que fracassou.

Disse isto sem solenidade nenhuma, como se não tivesse feito uma frase. De repente me perguntou se eu acreditava no Bem e no Mal. Não respondi; eu não acreditava.

Mas a nossa conversa estava ficando ridícula. Desagradava-me falar eu sobre esses assuntos vagos e solenes. Disse-lhe isto, mas ele não me deu a menor atenção. Grunhiu apenas.

· Existem.

Depois, afrouxou o laço da gravata e falou: - Há o Bem e o Mal, mas não é como você pensa. Afinal quem é você? Em que você pensa? Com certeza naquela moça que vende cigarros, de cabelos castanhos...

Estas palavras de Bebu me desagradaram. Ele dissera exatamente como por acaso aquela moça de olhos de garapa... Era assim que eu me exprimia mentalmente, era esta a imagem que me vinha a cabeça sempre que pensava nos olhos daquela senhorinha. "

Sei que não é uma comparação nova; ha muitos olhos que tem aquela, mesma cor meio verde, meio escura, de ca1d.o de cana; olhos doces, muito ver doces; e muitas pessoas já notaram isso; e até eu já vi essa imagem em uma poesia, não me lembro de quem. Mas a coincidência era alarmante; não podia ser coincidência. Bebu lia no meu pensamento, e, o que era pior, lia sem nenhum interesse, como se lê um jornal de anteontem. Isso me irritou:

- Ora, Bebu, não se trata de mim. Você estava falando do Bem e do Mal. Uma conversa besta...

Ele não ligou:

- Está bem, Rubem: o Bem e o Mal existem, fique sabendo. Você morou muito tempo em São José do Rio Branco, não morou?

- Estive lá quase dois anos. Trabalhava com o meu tio. Um lugarzinho parado...

- Bem. Lá havia um prefeito, um velho prefeito, o Coronel Barbirato. Mas o nome não tem importância. Imagine isto uma cidade pequena onde há sempre um prefeito, o mesmo prefeito. Esse prefeito nunca será deposto, nunca deixará de ser reeleito, sempre será o prefeito. E há também um homem que lhe faz oposição. Esse homem uma vez quis depor o prefeito, mas foi derrotado e o será sempre. O povo da cidade teme, aborrece, estima, odeia o prefeito; não importa. Pois é isto.

Bebu pós um pouco de cerveja no copo e continuou falando.

- É isto o Bem e o Mal. O prefeito acha que os bancos do jardim devem ser colocados diante da igreja: isto é o Bem. O homem da oposição acha que eles devem ficar em volta do coreto? Isto é o Mal. Entretanto...

- Bebu, deixe de ser chato.

- Não amole. Você sabe a minha história. Fiz uma revolução contra Deus. Perdi, fui vencido, fui exilado; nunca tive nem implorei anistia. Deus me venceu para todos os séculos, para a eternidade. É o prefeito eterno, ninguém pode fazer nada. Agora, se tem coragem, imagine isto eu saio de meu inferno uma bela tarde, junto meu pessoal, faço uma campanha de radiodifusão, arranjo armamento, vou até o Paraíso e derroto aquele patife. Expulso de lá aquela canalha, todas aquelas onze mil virgens, aquela santaria imunda. O que acontece?

Eu não respondi. Irritava-me aquele modo de falar Bebu continuou com mais veemência:

- Acontece isto, seu animal: não acontece nada! Você reparou quando uma revolução vence? Os homens se renderão diante do fato consumado. O Bem será o Mal, e o Mal será o Bem. Quem passou a vida adulando Deus irá para o inferno deixar de ser imbecil. Eu farei a derrubada: em vez de anjinhos, os capetinhas; em vez dos santos, os dem5nios. Tudo será a mesma coisa, mas exatamente o contrário. Não precisarei nem modificar as religiões. Só mudar uma palavra, nos livros santos onde estiver “não", escrever “sim", onde estiver “pecado", escrever “virtude". E o mundo tocara para a frente. Vocês não seguirão a minha lei, como não seguem a dele; não importa, será sempre a lei.

Eu me senti a atordoado. Percebi que lá fora, na rua, as lâmpadas se apagavam e murmurei: seis horas. Bebu falava com um ar de desconsolo.

- Mas não pense nisto. Aquele patife está firme. É possível depô-lo? Impossível! Impossível...

Olhei a sua cara. Dentro de seus olhos, no fundo deles, muito longe, havia um brilho. Era uma pequena, miserável esperança, muito distante, mas todavia irredutível. Senti pena de Bebu. É estranho, eu não passo olhar uma pessoa assim, no fundo dos olhas, sem sentir pena. Fui consolando.

- Enfim, meu caro, não adiantaria coisa alguma. Você como está, vai bem. Tem seu prestígio...

- Eu estou bem? Canalha! Pensa que, quando me revoltei, foi à toa? Conhece o meu programa de governo, sabe quais foram os ideais que me levaram à luta? Padre explicar por que, através de todos as séculos, desde que o mundo não era mundo até hoje, até sempre, fui eu, Lúcifer, o único que teve peito para se revoltar? Você sabe que, modéstia à parte, eu era o melhor da turma? Eu era o mais brilhante, o mais feliz, o mais puro, era feito de luz. Porque é que me levantei contra ele, arriscando tudo? O governo atual diz que eu fui movido pela ambição e pela vaidade. Mas todos os governos dizem isto de todos os revolucionários fracassados! Olhe, você é tão burro que eu vou lhe dizer. Esta joça não ficava assim não. Eu podia lhe contar o meu programa; não conto, porque não sou nenhum desses políticas idiotas que vivem salvando a pátria com plataformas. Mas reflita um pouco, meu animal. Deus me derrotou, me esmagou, e nunca nenhum vencedor foi mais infame para com um vencido. Mas pelo amor que você tem a esse canalha, diga-me: o que é que ele fez até agora? A vida que ele organizou e que ele dirige não é uma miséria? - uma porca miséria? Você sabe perfeitamente disto. Os homens não sofrem, não se matam, não vivem fazendo burradas? É impossível esconder o fracasso. Deus fracassou, fracassou mi-se-ra-vel-men-te! E agora, vamos, me diga: por pior que eu fosse, acha possível, camarada, acha possível que eu organizasse um mundo tão ridículo, tão sujo?

Não respondi a Bebu. Esvaziamos em silêncio o último copo de cerveja. Eu ia pedir outra, mas refleti amargamente que não tinha mais dinheiro na bolso. Ele, por sua vez, constatou o mesmo. Saímos. Lá fora já era dia:

- Puxa vida! Que sol claro, Bebu! Isto deve ser sete horas. Andamos até a esquina da Avenida.

Ele me perguntou:

- Onde é que você vai?

- Vou dormir. E você?

Bebu me olhou com seus olhos escuros e respondeu com um sorriso anjo.

- Vou à missa...

Julho, 1933

Wednesday, April 09, 2008

O fascismo nosso... - De madrugada

Cena: Viagem de ônibus, madrugada. O diálogo ocorre ainda na rodoviária..

-Mas, rapaiz, veja bem o estado dessa rodoviária...é um absurdo. Isso aqui é a porta do país entende? O que os turistas vão pensar quando passam nessa rodoviária, quebrada, suja, fedorenta...

(Pensei em argumentar que não havia turistas na acepção européia da palavras naquela rodoviária, e disse:)

-É um absurdo mesmo, e olha que já tá em reforma há um tempão...

-Pois é, e olha que reforminha mixuruca...tá tudo errado...

-Desse jeito vai demorar muito pra ficar pronto. Mas também isso fica assim porque não tem muitos turistas né, aí acaba que esse povo não fica com pressa pra arrumar direito.

-Tem sim. Olha só, se o cara vai pra Petrópolis tem que passar por aqui, ou então pra Búzio...se bem que não, Búzios já tem aeroporto internacional.

-...

- Mas olha só que lixo...tá tudo errado. (“Tudo errado” duas vezes é sinal que já vem...)

-...

- E esse Lula como pode. O povo burro, como pode eleger um presidente assim, um ignorante. É por isso né com esse povo também não dá pra fazer melhor, é impressionante. Eu tive esse dias no Acre e lá vi umas coisas que não dá nem pra acreditar. Um sujeito esfaqueou o outro na nossa frente por causa nada, esfaqueou como se furasse um saco de farinha, mas também depois o povo foi e cortou a perna do cara, e ele ficou lá, no chão agonizando...

-...

-Mas esse Lula... brincadeira viu. Vontade que dá é da gente pegar ele, raspar aquela barba e dar uma coça nele...

-O senhor é engenheiro? (era óbvio, mas perguntei)

-Engenheiro militar (que tipo de pessoa é essa?)

-Então você deve viajar muito né?

-Vou pra todo canto do país, ja viajei muito. Mas você sabe que tem uns lugares bem bacanas. Rondônia, por exemplo, é ótimo. Agora o Acre, meu amigo...

-...

-Mas na verdade são esses políticos todos, tudo corrupto, sabe... porque a gente não ta agüentando mais. Por mim a gente já tava na rua de novo. Pegar esses deputados safados, arrebentar esses caras... Nós tão pronto pra qualquer coisa, eu acho que tá demorando...

-Aham...

-Porque olha essa baixada fluminense, que desastre. Que merda. No meu tempo, isso aqui tinha comércio forte. Agora é só traficante... um absurdo.

-Pois é...

-Falta de vergonha, isso sim. Olha só eu tenho 41 anos. Entrei na escola militar em 86, com Figueiredo. Mas eu vivi minha infância com o Geisel...aquilo é que era bom, não tinha essa pouca vergonha. Vê só essas meninas aqui atrás. Meninas bonitinhas e tal, mas só falando palavrão, “porra”, “caralho”, vontade de ir lá e enfiar a mão nessas meninas, quebrar os dentes, e se chorar, mandar ainda engolir o choro.

-Isso é complicado né?

-Né nada, complicado é essas meninas ficarem falando essas merdas aí, e as mães de família ter que ficar ouvindo isso....isso é que é complicado.

- (coloco o meu fone de ouvido e finjo que vou dormir...)

- Ah não cara tá tudo errado hoje. Vê só, agora PM quer prender militar. Onde já se viu. PMzinho prendendo oficial fardado, naquela época não tinha isso não. Absurdo. Esse país ta piorando muito.

-...

-Mas o problema é que brasileiro é muito acomodado sabe. Tipo todo mundo agora só quer benefício de governo. Ninguém quer saber de trabalhar. Onde já se viu governo dá dinheiro pro povo. Ai vai e compra fogão, geladeira e nada de comida. Tinha que proibir. Falta disciplina.

- Disso vocês entendem né..

-Pois é. Veja bem, ta tudo muito acomodado, tinha que ter mais disciplina. É por isso que esse país ta assim, na merda. Ninguém tem disciplina.

-...

Friday, April 04, 2008

Brincadeira de Criança

Estava dentro do ônibus, e da janela observava o que acontecia numa pequena praça, no centro da cidade. Num misto de “flaneur” e psicólogo social em estado de latência, achava particularmente interessante um grande grupo de adolescentes que conversavam animadamente. Era um grupo de cerca de 15 a 20 meninos e meninas que brincavam, riam e conversavam naquele tom de recreio, hoje já um tanto nostálgico. O psicólogo social que me habita achou interessante o fato de todos eles parecerem trabalhar dentro desses programas tipo primeiro emprego, cruz vermelha e etc, pois estavam todos uniformizados. Aquilo deveria ser a hora do almoço, e eles ficavam ali juntos, como num recreio. Deviam ter uma média de 16 anos, e articulava a presença deles ali com a emergência dos programas de emprego, como a sociabilidade juvenil era afetada...blablabla, mas aí subitamente, no outro canto da praça, na frente de um prédio antigo em reforma, onde também jovens trabalhavam na obra vi algo muito engraçado. Eram cerca de 10 meninos encostados na parede do prédio. Mais uns 5 estavam espalhados num raio próximo, meio em círculo, fazendo o famoso “quilo” e se refazendo do almoço. Duas mulheres vinham passando, desavisadas, no meio do grupo. Subitamente um dos meninos saiu correndo e gritando em direção às duas mulheres, mas aí quando o menino chegou perto delas desviou e entrou no prédio. Nisso a mulher já havia expulsado o capeta que mora entro dela do tanto que berrou. Ela provavelmente não sabia se ficava puta ou envergonhada. Só dei que o resto do grupo se dobrava de tanto rir. Eu também não me contive dentro do ônibus. Sabia, no entanto, que se tivesse no lugar da mulher talvez fizesse o mesmo. E era essa a brincadeira. Deixar na cara das pessoas o ridículo do medo dos “pivete”, dos menino “de” rua. Pelo menos ela sentiu vergonha. Eu sentiria.

Antropologia de boteco na casa do senhor. Rubem Braga e Mr. Perna

No dia 10 de março do ano corrente o Mr. Perna jogou o texto "Um dia na Igreja" no seu blog. Não vou ficar aqui babando o ovo, mas a narrativa é muito foda mesmo. De chorar. Mas não teve jeito, lendo-o não consegui me desvencilhar da fixação por um outro texto, semelhante a esse, do meu paiespiritual-guru-mestre-almaguia: Rubem Braga.

REPORTAGENS

RUBEM BRAGA


O repórter de um vespertino carioca visitou uma casa em que viu muitos homens e mulheres cantando, um homem de roupa esquisita bebendo e rezando. O pessoa falava, às vezes, uma língua estranham e fazia gestos especiais.

O repórter tirou uma fotografia e voltou para a redação com uma reportagem atrapalhada falando de macumba, pai-de-santo, Exu, gongá, Ogum e outros nomes que servem para a cor local.

A reportagem acabava com a seguinte pergunta: “Que dirá a isso o senhor chefe de policia?”

Não tenho nenhum comentário a fazer a respeito. Quero apenas resumir aqui uma outra reportagem que fiz há tempo, por acaso, quando estava no Rio. Eu ia pela rua, certa pessoa me interessou e eu a segui. Ela entrou em uma casa grande. Como não tinha jeito de casa de família , também entrei. Dentro dessa casa vi tantas coisas extraordinárias que acabei esquecendo a tal pessoa.

Havia no fundo de uma ampla sala, armações de madeira, coloridas e iluminadas por pequenas lâmpadas elétricas e por algumas velas. Pelas paredes em buracos apropriados, haviam sido espalhadas estatuetas mal feitas. Um homem com uma espécie de camisola preta e com um pano bordado de ouro nas costas dizia palavras estranhas em uma língua incompreensível. A um gesto seu, mulheres e homens se ajoelharam murmurando coisas imperceptíveis. Depois apareceu um menino com uma camisola vermelha trazendo uma caçamba de onde saía fumaça cheirosa. Uma campainha fininha começou a tocar. Todo mundo ajoelhado abaixava a cabeça e batia no peito. O homem de camisolão preto bebeu um pouco de vinho e começou a meter na boca de cada velha que se ajoelhava em sua frente uma rodela branca. Em certo momento o menino de camisola saiu com uma bandeja. Pensei que ele fosse distribuir vinho, mas em vez disso recolhia níqueis e pratinhas. Depois umas senhoritas que estavam em uma espécie de camarote começaram a cantar. Vi mulheres com véus na cabeça e fitinhas azuis no pescoço fazendo sinais estranho e vi ainda muitas outras coisa mais.

Que dirá a isso o senhor Chefe de Policia?

Recife, 1935