Saturday, March 24, 2007

NOTAS DO INTERIOR I

Psicologia deve entender a cabeça das pessoas? Não sei. Acho que o importante são as formas de fluidez verbal. Algumas palavras são diques. Represam e interrompem o caminho, barram o transcorrer, as representações, conexões. “Anarquia”, “comunismo”, “violência”, “ateísmo”. Às vezes só sobra trovão e barulho, de idéia não fica nada. Hoje, aqui em Morada Nova de Minas, percebi que talvez seja preciso agir como espião. Eliminar palavras diques do caminho que liga a utopia sonhada à realidade miserável por mais imaginária que seja, mas dolorosamente vivida. Pensamento x Acomodação; Liberdade e igualdade x competição e o último que se foda. O problema é na transição, na transposição. Quando se comunicar, buscar entender pessoas e idéias diferentes, e fazendo isso escapar das palavras diques, por mais que elas encurtariam trajetos; problema é continuar sabendo de que lado se é, não se perder e acabar se formando nas concessões, na evitação dessas palavras diques. Tenho muito medo, dos discursos oficiais, do “politicamente correto”. Procede-se de maneira a afastar o fenômeno, como se pudesse manter a tal essência inalterada.

:..:..

Se agarrar as coisas que flutuam no mar de merda do lado de lá, mas se saber do lado de cá. Do lado de lá, no campo inimigo, chegar com o corpo de merda, ir no ventilador no país das utopias alegres, dos que vivem sem angustia e que pisam na merda, mas simplesmente se acomodaram nessa situação de classe fácil e privilegiada, apesar de também serem contra esses porcos capitalistas. Não às utopias alegres, não aos sem angustia, nada de vida leve.

5 comments:

Kiki said...

que bom que vc publicou isso. Morada nova foi importante sim para vc à medida que arrancou algumas ingenuidades suas. vc tem razão quando tem medo dos "discursos oficiais", aliás eu que fui criada neles, no "politicamente correto", se bem que sempre com muita angústia, só estou percebendo agora o quanto me afastei dos fenömenos. O importante sempre era nao abalar a certeza da posição, sustentar uma ideologia cegamente. fui adolescente desde quando começei a falar até muito recentemente'. Aliás, ainda não terminei de deixar a adolescência...mas não sejamos "puristas"!

Anonymous said...

É bom ler as angustias dos outros pra redescobrir as nossas. Lembrar de questões que haviam sido postas de lado por apatia, suposta falta de tempo ou o que quer que seja. VAleu!

Rafa Pros said...

É bom ler as angustias dos outros e se achar mesmo. Adoro isso. Mas sinto que isso favorece o narcisismo e o fechamento, mas também o encontro, a abertura. Só acho que não podemos procurar nossas angustias em todos os lugares, elas que devem nos achar.
E se meu texto te fez retomar antigas questões, fico feliz. As antigas questões que voltam num leve remexer são as que importam.
E gábi, não dá pra gente ser só critico a tudo tb (como eu tento não ser sempre)... mas tb não dá pra viver entre idolos e acreditando neles por mais lindos que eles sempre pareçam.
E não acho de forma alguma que vc seja afastada dos fenomenos, vc é uma vivenciadora de fenomenos por natureza, uma exploradora, uma descobridora...e isso é muito foda. O problema é dissociar fenomeno/essencia das nossas idéias, pensamento...o problema é sempre vivenciar mesmo e deixar se levar mmuito pelo que se vive (algo que eu muito dificilmente consigo fazer) por causa do desapego. Nós obssessivos somos muito apegados a nossa existencia mesmo que traumática.

Rodrigo said...

Sensacional esta passagem, tem tantos "alegres" que eu gostaria que entendessem:

"Se agarrar as coisas que flutuam no mar de merda do lado de lá, mas se saber do lado de cá. Do lado de lá, no campo inimigo, chegar com o corpo de merda, ir no ventilador no país das utopias alegres, dos que vivem sem angustia e que pisam na merda, mas simplesmente se acomodaram nessa situação de classe fácil e privilegiada, apesar de também serem contra esses porcos capitalistas. Não às utopias alegres, não aos sem angustia, nada de vida leve."

[]s!

Rafa Pros said...

que bom que vc gostou Rodrigo. Realmente é necessário espalhar a merda ainda. talvez seja essa a nossa "missão Nietzsche" com todas as ironias.