Wednesday, February 27, 2008

As madrugadas de led zeppelin, escuro e solidão que não voltam mais .. .

Um dia fui um menino puro. Acreditei na ilusão da maior felicidade do mundo num dar as mãos e andar suspirando. Era essa a imagem mais linda que podia imaginar, eu e uma criança chamada Carolina de mãos dadas caminhando como velhos pelos jardins de nossa escola, nos idos de 92. Deitava e sonhava com isso, muito concentrado nessa fantasia. Às vezes eu chegava até a acreditar. Escrevia nossos nomes, nas páginas de meu caderno, encarcerando-os no rabisco de um torto coração. Ela era quieta, calada e majestosa. Tinha a beleza e o encanto possível às meninas de 9 anos. Calçava pouco, muito pouco, os pés pequenos me sinalizavam aristocracia. Todos + 1 a amavam desde a primeira série. Já estávamos na terceira. Imaginava que ela me via da mesma forma que eu a via, e que também seria tímida. Gravava “nossos” momentos na minha mente, sacralizando-os. À noite refletia o que ela poderia ter pensado ao me ver, e por aí vai. Foi aí que morreu minha ingenuidade. Depois disso a vi algumas vezes, e fiquei triste. Ela me pareceu muito mais consoante com as aspirações concretas da sua, nossa, classe social, do que posso suportar. Continua bela, mas nada, nada resta da princesa pura que me habitou por tanto tempo. Envelheceu mal.
Lembrei dela ao encontrar um colega desses outros tempos e espaços numa pelada de terça sem ousadia. Esse menino, que achei nunca mais encontrar no mundo, foi muito importante para a minha vida, ainda que não tenha a menor pista disso. Ele mostrou que minha pureza acabaria. Ele trouxe o estúpido pra fora. Mario Vargas Llosa, no romance “Conversa na Catedral”, mostra a angustia do personagem principal pelo fato de nunca mais ser puro. Nunca fomos puros, é claro. Nada há de certo nisso. Tem tudo de arbitrário. De conseguir acreditar na pureza. Acreditava no amor, na alegria e na compaixão. Eu bati nesse menino por covardia, eu era grande e ele pequeno, magrinho...depois senti uma revolta estranha comigo. Bati porque queria bater, porque era maior que ele, porque eu lutava judô. Uma semana depois foi seu aniversário e eu fui. Com vergonha, mas fui. São lembranças desanexadas muito vivas em minha mente. Ele não se lembrou de mim e por bobo que seja, a verdade é que senti alívio. Ao vê-lo tive uma certeza. Nunca mais acreditei na pureza das coisas como naqueles tempos. Ainda mais pra frente fui sincero na minha solidão em noites de Led Zeppelin e Jethro Tull. Mas a fantasia foi se escasseando. Talvez em Rubem Braga e na crônica tenha encontrado um último leito para finalmente falecer em paz, sem barulho, nas curvas das nossas ruas e mulheres.
Um sujeito escreveu que o desafio do adulto é ser sério como criança ao brincar. Ao final do filme “Malena”, o personagem principal e narrador diz uma frase que me deixou maravilhado. O filme narra a paixão de um menino de 10 anos por uma mulher linda, sedutora e deliciosa (não ao acaso interpretada pela Mônica Belucci). Seguimos o menino pelos seus desejos numa pequena cidade italiana, durante a segunda guerra mundial. Ao fim do filme ouvimos o menino, agora um velho, dizendo: “Depois de Malena, tive muitas mulheres, mas nunca amei nenhuma delas como a amei.”
Desafio do adulto: amar com a pureza que amam as crianças.

5 comments:

Prós said...

"Bunito!" []s!

Rafa Pros said...

tava com saudade da sua presença aqui, Chicão... Valeu!

Locadora do Werneck said...

Eu tinha escrito um negócio enorme, mas deu pau aqui e perdi tudo. Paciência. Só queria falar que eu não choro em despedidas porque a felicidade dos amigos tem que a nossa. Só vim trazer uma musiquinha pra você assoviar na estrada. Aquela que começa assim... taranananannn... tarananana tananana...

Hey lady, you've got the love I need. Maybe, more than enough. Oh darling, darling, darling, walk a while with me. Oh you've got so much... So much... So much...

Many times I've lied, many times I've listened. Many times I've gazed along the open road.

Many times I've lied, many times I've listened. Many times I've wondered how much there is to know.

Many dreams come true, and some have silver linings. I live for my dream and a pocketful of gold.

Mellow is the man who knows what he's been missing. Many many men can't see the open road.

Many is a word that only leaves you guessing, guessing about a thing you really ought to know...

Unknown said...

que bunito! e tem mais; você disse que perdeu a criança que foi um dia, e eu digo que não, que esta criança está muito viva e nos presenteando com suas sinceras palavras adultas.

Ah...Led Zeppelin e Jethro Tull é muito bom, até hoje!

Rafa Pros said...

Perna,
valeu demais cara. sou seu fã... E a festa bombou muito, nao te agradeci por isso. Sua selecao incendiou o ape..hehe
(ps: fiquei curioso com o q vc escreveu...da mesma forma q os psicanalista tb me interesso pelo nao dito..)


E raquel, so posso agradecer o carinho aí...