Friday, December 23, 2005

DADOS NO AR

Rafael Prosdocimi

“Quem é você? Diga logo que eu quero saber o seu jogo, que eu quero morrer no seu bloco, que eu quero me arder no seu fogo...”

Não diga, silêncio. Quem é você, é uma pergunta feita e só. Feita para que dali surja outra pergunta. E outra e outra. Já surge alguém na minha vista. Outras, algumas, poucas.
Nesses dados suspensos no ar, na vida. Dados que são belos enquanto no ar, enquanto não são ainda nada, e mesmo tudo, e qualquer coisa que eu quiser. Não precisa ser carnaval, não precisa de máscaras, mas não me diga quem é você. Pelo menos não ainda. É belo falar com uma mulher, pensar nos seus jeitos, sem que ela exista, sem que haja um nome, e manias, e medos. Acho que é essa a minha sina, o meu pecado, a minha cruz. Viver de desconhecimento, da ilusão que é mortífera, a que quando revelada, desfaz todo o nó da vida.
E você me vem agora, dizer do pai, do futebol, dos termos psicológicos, de uma paixão passada. Ah, moça tenho um desejo muito enorme de saber quem é você e não saber, e que você me perdoe, por isso, de tão tolo e covarde. Você já me conhece, não seria algo novo. Você não é uma desconhecida, nunca foi, é uma mulher conhecida, mas um mistério, que apenas me suspende, um pouco, do Tédio.
Não sou atencioso com você como quem escolhe ser atencioso (gentil ou amável) e essas detestáveis coisas. Você me escreveu coisas tão belas aqui, que deu gosto nisso tudo, nesse barulho, nesse som que ando e andas fazendo. “Anônimo disse...”. Anônimo é uma pessoa, alguém que não diz o nome. Ah... Mas atrás da minha tela, na frente da sua, jaz uma mulher que lembra, sorri, e fica em dúvida. Lembra talvez dos nossos momentos. Sorri das minhas gracinhas, tão pontuais que chegam já na beirada, no cume do sorriso, e esticam os lábios, de lado. Mais um pouco ainda. A dúvida, dessa revelação lenta, dolorosa, viva. Vejo carne, e sangue nas suas palavras. Um sangue seco.
“Ganhei o dia com o seu comentário”. Essa sua colocação foi como um gancho de esquerda, nos rins, seguida por um murro na cara. Um golpe (será, premeditado?) que derruba. Essa frase tão minha. Esses dias que só eu perco. E perco com toda a força de quem se faz perder. Ninguém mais me faz perder os meus dias, além de mim. E se você não me fez ganhar o dia (acho que não, ando “expert” em me derrubar) conseguiu, ao menos, revitalizar algo que se apagava (espero que não para apenas um último suspiro). Eu que uma vez tive coragem de mandar para uma moça, que poderia, em termos, ser você, a frase musical “Você me ligou naquela tarde vazia e me valeu o dia”, com toda a breguice do mundo e mais uma vez vejo você me valendo o dia, em mensagens postadas no meu blog (eu que tinha tanta vocação pra nunca ter um blog na vida).
Num outro comentário, a senhorita me mandou ler o texto da Marina Colasanti (não entendi, em absoluto a ligação com o outro texto que te mandei, da desilusão, do Thomas Mann). Mas esse texto lindo que diz “a gente se acostuma, mas não devia”. Essa frase mágica, frase que nos desperta do que chamamos: realidade (“ta lá um corpo estendido no chão”, violência, descriminação, misérias carnais, espirituais, mediocridade, falsas vontades, e quando vontades, só as de superfície). Frase que lembra que antes de acontecer, nós nos acostumamos e não devíamos. E de costume em costume logo estaremos casados com qualquer coisa, alimentando bactérias, filhos e vírus todos esses seres que num futuro próximo só pensarão em nos sugar toda a energia, e também trabalharemos em qualquer coisa que não vale a pena dizer, levando menino ao zoológico, e ao fim do dia sentando numa cadeira com “a boca escancarada cheia de dentes”. È esse costume que não quero. É isso. É o número que saí dos dados no ar. E o numero que fica. E consome.
Não mais dados no ar. Sei lá se suporto isso de dados cravados no chão.
Que os dados permaneçam no ar. Mas a gente também se acostuma com a solidão e a inquietude e também não devia. Assim como nos acostumamos com um corpo ao lado, e a segurança do corpo ao lado, as nossas convicções, os nossos escuros preservados e distantes, lacrados. Quantas vezes não vejo casais, e por um segundo sinto ciúme dessa cumplicidade, por um segundo não me pergunto quem seria o otário da situação, e o quanto não estarão eles Mortos, enquanto de cá tomo minha triste cerveja, e falo qualquer tolice tentando profundidade.
Você, moça, acaba despertando esse meu Ouro mesmo que Tolo e que brilhe apenas à meia luz.

3 comments:

Anonymous said...

Pros,
larga a mão de ser hipócrita e me chama pra ir prum buteco tomar umazinha...

Anonymous said...

Rafa...Depois deste texto, ainda q n fosse natal...seria natal pra mim!Fiquei feliz demais em saber q alguns minutos da sua vida (ou foram horas?) foram gastos escrevendo algumas linhas sobre o impacto dos meus comentários sobre vc. Modesta...Esqueci q tinha q comprar presentes, ir pra ceia, trocar o amigo-oculto...queria só ficar lendo estas, q ja foram relidas cerca d 734 vezes!! N, confesso, foram apenas 17...Foi engraçado demais qndo eu vi a cronica, no inicio n tava entendendo q era sobe mim, e meu pai ao lado querendo q eu entrasse num site pra ele...e eu nem ouvindo... e ele n entendendo nd! Foi lindo! Fique extasiada!Pois bem, to preparando uma resposta pra vc...mas talvez demore! Valeu mto por utilizar a sua sensibilidade e a sutileza de suas palavras com um assunto t vago qnto eu...um ser anonimo!!!Bjos pra vc, com a maior kra d felicidade, q é, em gde parte, responsabilidade sua!!!

Rafa Pros said...

Modesta? Isso é uma dica? Estou aguardando, com muitos tres pontos......