Monday, October 23, 2006

QUANTO SOFRE UM ROMÂNTICO POR AMAR UMA MULHER DE VERDADE

Para fins de consenso, definiria um romântico com alguém que vê no amado, ou amada, o destino final de todo sentimento que há na vida. Como se a pessoa que se ama, fosse sua desde os momentos iniciais da existência, e tudo o que aconteceu desde a sua formação embrionária, dos tropeços infantis até as transadas juvenis, fossem meros ricocheteios, tipo fliperama, para que o amor chegasse, enfim, a você: o destino final. E agora fossem ambos começar a viver de verdade. E é isso, por mais que não seja.

Nesse sentido o relacionamento só existe entre dois, e todas as outras pessoas são paredes. Por isso dizia Hannah Arendt que o amor não é só apolítico, mas anti-politico. Pois quando se ama uma pessoa, destina-se todos os afetos e vontades a essa pessoa, esquecendo-se do mundo. Amar, para nós românticos, é ter na pessoa amada o único porto possível na vida, e sentir que se é também esse único lugar de aconchego. Sempre tive ódio das mulheres que se colocam a disputar homens como se fossem esses cavalos. Machos e fêmeas me inspiram tédio e preguiça. Como diria o Tom Jobim, sacanagem mesmo é amar. O amor é platônico, e encontra nas carnes e córneas materialidade, esbarrão possível frente ao inenunciável.

Por isso a ilusão é tão necessária. Ela acomoda o que a gente sente e não consegue dizer. A idéia de princesas e príncipes. E a ilusão é achar que esses dois últimos parágrafos fazem algum sentido. O melhor, para quebrar a ilusão, é colocar nos colchetes da vida variáveis várias, diversas incógnitas, e proceder com equações do tipo 3x=y, ou 2z= w/7...Ou seja enunciar que houve mais vida nos anos anteriores, e que na função amor de tal menina, você agora desempenha papel de variável tal, sempre passível de substituição e comparação com uma outra variável dessa mesma função. Isso sem dizer das comparações torpes, tipo tamanho de coisas. E o além pior são as quantificações. Tipo quantas variáveis passaram pela sua cama? Como entender que 1 mulher vale às vezes todas as outras, ou simplesmente não valem nada frente a você? E então procedimenta-se o desencanto. E, as vezes, uma palavra basta para romper esses castelos de areia, frágeis e fundamentais para se ir levando. E a ilusão, veja bem, é só aparência mesmo, mas a essência tem que ser real. O amor existe, independe da ilusão. A ilusão é o mal que persegue os românticos, ou os religiosos falsamente convertidos em pessoas céticas e racionais. O romantismo é a parcela de encanto que devolvemos ao mundo. E a ilusão sadia é essa acompanhada do amor real. Peço a ilusão por ser um romântico, e não por amar simplesmente. Frente a dois olhos não suportaria nunca uma leve comparação. Não as faço.

Cada mulher carrega em si as marcas dos gozos mais difíceis e cruéis; carregam nos contornos do corpo o abandono corrente, a mordida que dilacerou não apenas matéria; carregam todo o sofrimento do encontro e mais ainda do desencontro. E isso se apreende de ver e olhar. Não é necessário dizer. Essas aulas são dadas em silêncio.

Chamem-me de moralista, inseguro, iludido, medroso, frágil. Mas preciso de encanto. Preciso de pão e não de carboidrato. Nada pior do que evocar um “y” quando se está nua com o “x” a lhe admirar o traço dos seios. Amar uma mulher real dói muito às vezes. A mulher real tem passado e não acredita nos meus belos primeiros parágrafos. Preciso da ilusão, preciso ver nos olhos só o eu refletido, e ver no “eu”, o tudo. Se a mulher não consegue me manter nesse lugar, o amor se torna algo doloroso. Aí surgem os fantasma da duvida, a preocupação das performances, as questões materiais que afastam sempre o supremo gozo. Surgem os outros, surgem adversários quando estes não fazem o menor sentido...a traição mesmo sempre começa antes...

Sofri um bocado quando ela perguntou “Com quantos variáveis você já enfrentou a função sexo?”. Não pela vergonha da resposta (não a tenho) ou algo do gênero, mas o de pensar o porquê dessa pergunta? O que ela quer saber com isso? Bom, se isso aqui é sexo, isso já não é mais nada para mim. A função sexo entrou na minha vida pouquíssimas vezes. E ela se diferencia da outra função, amor, pelo sono que se tira depois do ato, ao lado da mulher; pela leveza do pensamento; pela vontade ingênua de ver nessa mulher deitada, a mãe dos meus filhos. Sexo implica em pensar que horas ela vai embora, e mais, “porque ainda não foi”. Sem querer dar uma de Jabor, sexo se define pelo ato, mas amor explode e se espalha por todos os entornos e tonalidades que a vida subitamente adquire.

Fica a ilusão. A necessidade de ver na mulher que me ama a fatalidade desse ser. Sem hipocrisia. Sem mentira. Eu preciso da ilusão, e sei disso. Mas a cada dia que passa é difícil mantê-la. Há muito pragmatismo ao redor. Logo as pessoas vão jogar no Excel as transas e as performances, tal qual as estatísticas dos jogos de futebol.

Bem sei que sexo é bom sim. Mas a ilusão da eternidade, isso... é outra dimensão. E é lá que quero estar. Que me perdoe a minha parcela materialista.

2 comments:

Carol said...

( Só hoje reencontrei seu blog e ele é tão bom que fico meio com vergonha do meu :P. Aliás, obrigada pela música. Ainda não conhecia aquela do Raul).
Eu sou muito machista às vezes. Ou isso tá no pacote desilusão. De toda forma, acho ótimo quando encontro um homem dizendo coisas como "Preciso da ilusão, preciso ver nos olhos só o eu refletido, e ver no “eu”, o tudo. Se a mulher não consegue me manter nesse lugar, o amor se torna algo doloroso".

Até mesmo porque seu texto traz uma entrega que é difícil encontrar em grandes autores que, no fundo, como diria minha professora do colégio: românticos não amam ninguém, eles só amam amar. Que bom que no seu caso o amor está além do verbo.

Rafa Pros said...

Rá! Valeu pelos elogios. E nem vou falar bem do seu blog pq vc sabe que ele bomba muito! afinal, ele gera muito discurso, a galera se mobiliza, diz, briga, fala da história, o que é o mais foda de um blog)..
Bom, acho que não é uma musica, é mais um texto do raul mesmo que achei na internet, o que significa que pode ser da vovó clementina (mas acho que é dele mesmo...)
Mas pq vc é machista??
Não, hehe, minha parcela idealista é bem materialista e ama pessoa mesmo..
Bom te receber por aqui...
e como está escrito no papel da padaria aqui da esquina:
"Volte Sempre"...bejão!