Thursday, January 05, 2006

É SABINO, VOCÊ TAMBÉM NÃO SABE A FALTA QUE ELA ME FAZ...

Rafael Prosdocimi

Desligo a música que tocava, curto o silêncio, e com isso paro de pensar em outras coisas que não na nossa curta, e já antiga história Agora faz silêncio. Como é difícil ter silêncio nessa cidade, nessa casa. E eu que sempre gostei muito das segundas e das quartas-feiras, ando preferindo os fins-de-semana, principalmente os domingos, apenas pelo silêncio. E é nesse silêncio que ela me vem à cabeça. Já faz algum tempo que não a vejo. Materialmente. Faz mais tempo ainda que não a olho nos olhos e digo do mundo e da vida sem produzir sonoridades. Um tempo suficiente pra olhar pra trás com ternura, tristeza e um certo desprendimento de mim mesmo. Já sinto que aquela nossa breve história não nos pertence. Isso significa que acabou, para sempre. Essa ultima frase me entristece, ainda mais lida em voz alta, e espero estar enganado. Sei que não estou, mas afinal o que tenho eu com aquilo que “sei”...
Sei que quando na sala de aula, ou em qualquer outro lugar, armado de uma caneta e encarando um papel; é ela, é o seu nome que me vem à cabeça. Escrevo seu nome todo no papel. “A. M. A”. Nunca tinha visto assim, pensado dessa forma. Seu nome completo, junto, ama. Amava. Deveria tê-la amado. Ao menos mais, de forma etérea, segura e progressiva.
Escrevo seu nome como a tentar circunscrever seu encanto, dar nome, entender quem ela é. Mesmo que nunca tenha sido perfeita. Como diria o Bob Dylan, “Just like a woman”. Uma mulher com alguns medos, preconceitos e paixões. Com algumas idéias e um tanto delas erradas e tristes.
Essa moça encontrou um rapaz muito assustado com a novidade das mulheres, e isso tudo representado pelo encontro da pele e do olhar, isso que é “mais grande”, dessa cumplicidade que há entre duas pessoas. Ah, esse rapaz aprendeu alguma coisa com ela. E sei que também ensinou. Foram apenas 10 meses. E mais algum tempo de distensão, indecisão, de arrogância dele. Tempo esse que culminou numa última, linda, cruel e dilacerante noite.

“She makes love, just like a woman (…)
But she breaks just like a little girl.”

Ele, infelizmente, achava que havia um mundo de outras “possibilidades”, de “contingências” de “novidades” (já não sabe quais). Esse desconfiado do “amor”. Um explorador dado a poesias. Dado a encarar desconhecidas por detrás de medos e pára-brisas, à procura de beleza, sorriso...Sabe? Essas coisas. E ela já tão devotadamente amorosa, pensando em coisas certas e fixas, pautada numa realidade muito definida. Nele, esse fenômeno a dois, tinha sempre o súbito despertar da poesia. Essa que fica ressonando até encontrar palavras. Mas ela vivia seu romance como qualquer “milady” de um livro do século XVIII. Havia pássaros na sua vida, e sinfonias. E a cerca, de sua casa, seria branca, e a férias seriam em Cabo Frio, odioso Cabo Frio, que já não existe. E ele se afundava nessa tragédia que se tornava a sua vida fácil, sentia que precisava tentar lonjuras, e abismos, e angustias maiores. E a poesia a dois foi se escasseando para ele. Surgia o misterioso Mundo. E do outro lado Cabo Frio se mostrava o pesadelo para a poesia. Essa vida besta (e angustiante) como tão belamente me contou Paulo Mendes Campos. Mas a verdade é que hoje ela faz muita falta no sentido do dia, do dia e da noite. E não há angustia maior. A falta do ventre, dos seios, dos olhos, das marcas. Do cheiro. Desse contato com a vida, maior do que ler “e-mails”, atender telefonemas, e, quando muito, dizer: “bom dia, tudo bom, né?”, para alguém que passa a caminho de lugar nenhum.
Ela preenchia a minha Vida, e agora, nos últimos meses, vem me visitando com mais freqüência do que o necessário. Do que o suportável. Mesmo com o tal desprendimento – mentira - e ternura, tristeza.
A.M.A, tinha muitas dores, e de todas eu sempre fugi. Sinto que ela encontrou seu porto seguro, para que a tal Vida, essa que eu já não suporto também, não a incomodasse mais. Provavelmente irá agora no próximo show do Skank, deve ter visto o ultimo capítulo da novela, e amanhã, no bar, vai reclamar e fazer coro sobre a violência de hoje em dia. A.M.A trabalhará muito, ganhará dinheiro e de vez em quando lerá minhas pobres coisas, no parar de sua vida; achará algo bonito da nossa história, e logo se preocupará em fazer qualquer coisa que despiste o pensamento. Eu continuarei eternamente muito disposto a ser uma eterna promessa de qualquer coisa que nunca será nada. Perguntarei-me muito “Como se chegar a ser o que se é?”. E nunca terei a tal resposta.

Um pouco mais ainda, um recado pessoal, para você, que eu covardemente (como é de meu feitio) coloco aqui no meio de coisas vagas e gerais, com uma expectativa abstrata de que chegue a você. Ainda te procuro nesse seu carro de marca japonesa que nunca lembro direito a cor, se é dourado ou cinza (chumbo). Preferiria que ele fosse dourado. Procuro você dentro do carro dessa marca, de qualquer uma dessas duas cores, mas acabo não resistindo e te buscando em qualquer outro carro, em qualquer outro lugar da vida, até em bicicleta ou restaurante, cemitério ou jet ski. Antes era mais fácil, pois te buscava naquele carro prata, 1984, testemunha muda e coadjuvante do traumatizante, lindo, e épico Ultimo Dia.
Ah, mas se fosse só a rua que me prendesse à sua lembrança. Mas esta casa minha, de tudo, tem um pouco da sua fantasmática presença. Em cada canto lembro de algo seu que ficou, na parede, na mesa de vidro, na cama. E não ficou pouco. A varanda, às vezes trancada, às vezes aberta e por muitas testemunha de um amor veloz. E você se lembra daquelas bolas de vidro que ficavam (e ainda ficam), em cima da mesa da sala? Lembra...Aquelas bolas que num abrir muito inesperado de portas foram reviradas na velocidade do despertar para a realidade e se bateram uma com a outra, e ambas bateram no suporte de vidro, que quebrou um pouquinho. E hoje resta um buraco nesse suporte de vidro (e não só nele). A cama hoje solitária, quieta. Aqui tudo me lembra você. Ainda mais agora, no final do ano. O melhor natal da vida de uma criança, um moleque cheio de esperança aos 20 anos de idade. Aquele arroz piemontês, lembra?
Havia vida no meu mundo, entre as minhas monótonas diástoles e sístoles. Seus ossos e sua carne correspondiam e respondiam fielmente ao meu corpo e tudo isso era tão banal, tão automático, havia tão pouco esforço de minha parte em fazer aquilo de bom acontecer, que eu achava que era fácil de se encontrar por aí. Nessas outras. E nunca foi. A banalidade era parte do plano do Demônio Maligno, em me enganar fazendo achar que havia algo chamado Mundo. Não existe o Mundo, não há Cabo Frio, e o que dizer de Búzios? Ah... Búzios, aquele seu vestido (diabólico vestido que você nunca mais usou), e ainda a senhorita caindo como uma bêbada naquela rua de grandes pedras e muitos dólares. Lembra?
E para os reacionários de plantão e para você também, saiba que não é do tempo que tenho saudade. Saudades sinceras de sua risada absurda, meio soluçada; de seus olhos, que brilhavam como se você chorasse; e de seus ossos, todos eles, pontudos que quase doíam, senão me fizessem amar. O tempo não existia nessa nossa equação. Aquele tempo era só o de estarmos sós. E nunca mais me houve paz como aquela. E num depois, que é ainda hoje, tento e tentei em vão. Não muito. Já não acredito em grandes números. Mas tentei. Que a sua vida seja boa e que a cerca seja branca, e que sempre haja sol em Cabo Frio. Que você se lembre de mim um pouco de vez em quando. Aquele seu choro, o seu choro solitário na minha cama. A sua conclusão sábia e triste sobre o nosso óbvio fim, marcada pelas suas lágrimas, pulsa, lateja na minha cabeça. E eu que nada entendi daquilo (ainda não entendo), prossegui na minha ilusão tenra, doce e despreocupada, de sempre um possível e tranqüilo amanhã, como agi sempre com todo o nosso amor. Mas mesmo apesar desse tranqüilo amanhã, e, talvez, por um entendimento inconsciente das coisas, eu já vinha, progressivamente, “te decorando pra levar comigo". E te levei para sempre quando você se foi.

3 comments:

Anonymous said...

Humm...Q delícia este texto Rafa...Fiquei lembrando d tantas coisas! Eu tava escrevendo um, q falava tb sobre um amor(detalhe, eu o perdi...os dois!!)e sobre aquele filme, Um amor pra recordar, vc viu? No texto eu dizia q o mais importante d um gde amor é q ele acabe, q n dure para sempre, q seja apenas uma bela lembrança... e q por isso sustente qm vivenciou tal experiência. Ainda penso assim, e tento olhar para as minhas lembranças como algo mto precioso, algo q nem todas as pessoas q vivem uma vida inteira têm oportunidade d experimentar.Afinal, o q realmente importa são as histórias q temos pra contar...Mas, no fundo...ainda espero q seja pra sempre...Bjn pro Pros!!!

Rafa Pros said...

Engraçado como coisas da vida tem um momento único de despertar, e surgir na vida. Adorei essa sua passagem:
"No texto eu dizia q o mais importante d um gde amor é q ele acabe, q n dure para sempre, q seja apenas uma bela lembrança... e q por isso sustente qm vivenciou tal experiência."
Acabo de receber o email mas estupido da minha vida, dessa moça, fruto do texto acima. Acho que as pessoas tem dificuldade em lidar com essa nossa vontade de lembrar. Mas é isso aí. Como vc já disse aqui não é o lugar pra bater papo. Desculpa por não ter comentado antes, mas só agora tocou o despertador!.
Bejos
rafael

Anonymous said...
This comment has been removed by a blog administrator.