Sunday, October 30, 2005

Hannah Arendt a 40 graus Celsius, ou apenas uma carta atrasada pro Chico

Estava sentado estudando nesse quente feriado. Estudava com o prazer de quem faz algo que gosta. No meu caso procuro, na junção de palavras, conceitos que me permitem (presumo eu) entender a realidade social, política, psicológica. Faço isso com um imenso prazer como quem, nesse mesmo dia de feriado, colhe manga num sitio ou faz gol de letra. Faço essa busca por bons conceitos com um prazer que acaba anulando a sensação de trabalho, o que é uma pena, pois como bom cristão (que nunca quis ser e não sou por opção) aprendi (melhor: vivi) que trabalho= sofrer = ser humano. Ou seja, aprendi que não dá pra trabalhar sendo feliz (isso só pode ser coisa de jogador de futebol ou de comunista) o que hoje tem conseqüências, senão desastrosas, sem duvida algumas desgastantes. Como ando fazendo o que gosto todo dia, tenho um pressentimento de que sou um vagabundo. Será?
Sei que nesse feriado de calor e céu azul fui estudar um pouco da espinhosa teoria política de Hannah Arendt. Sentado, logo começo a suar. Esforço-me e acabo alguma coisa lendo e aos trancos e suores vou estudando. Acontece que uma “delas” (essas idéias que não tem permissão de pouso) me invade a cabeça e aí começo a divagar sobre aquelas teorias européias (daí donde você tá Chico) que relacionam a nossa provável e tropical estupidez à incidência perpendicular de raios solares. Suar não combina com estudar, combina com uma porção de coisas, algumas das quais nem poderiam aparecer nesse papel. É fácil imaginar Nietzsche, Kieerkgaard, Schopenhauer e outros senhores com nomes cheios de consoantes, durante um inverno, no velho continente, passando horas “a frio” a estudar e filosofar. Estudar combina com o frio da mesma forma que o frio combina com a angustia. O frio traz o acolhimento e retraimento necessário a qualquer estudo decente. A concentração nas letrinhas e nos numerozinhos, o que seja.
Agora... Aqui no Brasil, nesse calor, num dia de feriado, sentar e estudar, enquanto as células sudoríparas trabalham, é muita persistência. Ainda, sabendo que (como diria o Rubem) “há moças que passam lá fora” o que acaba desmoralizando toda a atividade intelectual. E que essas moças, nesse dia de calor utilizam parcos pedaços de tecidos o que transforma o esforço, de estudar filosofia política, em algo de extra-humano, o que, obviamente, para um filósofo niilista existencialista pseudo-atleticano, não existe.
A partir disso tudo eu então proporia um estudo da relação entre teorias filosóficas e cientificas e o clima (nada muito criativo, já sei Chico), assim como a comida, a estação do ano, a umidade, o jogo do Madureira, o sorriso da Flavia, e a proporção de marquinhas de biquíni na cidade. Penso que teríamos aí boas teorias filosóficas e cientificas. Não dessas que me dizem que eu me diferencio do Chimpanzé em 0,1%. E aí penso no Chico que ta lá na Inglaterra (analisando o que tem nesse 0,1 %). País esse que agora se encontra no outono. País que não tem marquinhas de biquíni. Não tem samba. E os sorrisos são raros e ainda há a inexistência de uma boa feijoada. Não que eu coma muita feijoada por aqui, mas é necessário saber que, a qualquer dia da semana, encontramos uma feijoada por aí, na esquina. Ela deve existir no imaginário, e bem, vez ou outra no estômago. Sei que o Chico ta lá nesse lugar inóspito à existência de alegria, sorriso, batuque e torresminho o que deve fazer dele (que já tinha todo um campo pré-preparado) um puta hiper super-filósofo tristonho. Ateu, cético, agora triste (afinal sem samba!!) penso que o Chico, que agora também escreve freneticamente, vai “dar para um bom intelectual”.
Aproveito pra mandar a critica inicial daquele seu conto do Casamento. Acho que ficou muito grande, a primeira parte da histórica ficou meio chata, mas pelo que vi da segunda parte, isso junto vai criar um fenômeno fantástico, igual ao que aconteceu comigo, num outro dia, quando fui ao Opção. Fui com um certo tédio do mundo e sem esperança de alegria no coração, e acabei encontrando em beijos, abraços e sorrisos uma mocinha de olhos amendoados (não queria ser tão estereotipado na descrição) e pele morena. Isso me lembrou de potencial único daquele lugar em transformar meus desleixos na relação com senhora vida, em amor e tesão. Sei que a diferença, nessa noite, da experiência pra esperança consistiu em um delta positivo. Pouca esperança e uma experiência maravilhosa. O que na verdade acontece ao contrário todos os dias nas sociedades ditas, pós-modernas, na qual a esperança, sempre gigante, não condiz com uma experiência medíocre o que nos leva a uma insatisfação generalizada, mas isso nem mesmo é Hannan Arendt, e sim Agnes Heller e definitivamente não sei o que eu falo mais. È o calor.
Boa noite Chico e que essa carta (email, assim como digitar, não tem o menor senso poético) leve um pouco do calor que tanto conheces daqui, um Fá e um Sol sonoro assim como um tapa no pandeiro (com carinho como se fosse um tapa na mulher amada) e um gole de Skol, ou quem sabe, até mesmo uma Brahma.

2 comments:

Prós said...

Tá, essa carta vai exigir uma resposta mais elaborada. Espere e verás...

Prós said...

Clica no chico pros aí em cima pra ver a resposta...