Monday, February 28, 2005

O travesseiro e eu, uma história.

Rafael Prosdocimi

Eu não sou do tipo que coleciona nada, não tenho amor por nenhum objeto, e se uma vez namorei uma menina há algum tempo, foi mais por curiosidade mesmo. Dessa forma, eu nunca tive um brinquedo predileto, um bichinho de estimação, algo, sem vida, no qual prolongamos nossa existência. Quando moleque isso me incomodava, não ter um brinquedo predileto é quase como não ser criança. Como bom psicanalista, que nunca serei, acho que esse fenômeno deve ter algo a ver com o investimento libidinal. Todos elegemos nossos pedaços de tecido e plástico para amar, principalmente na ausência de tecido humano, calor, caricias que vêm e vão.
Acho que foi por isso que escolhi meu travesseiro, velho, pequeno, manchado e sem espuma como objeto favorito. Havia uma ausência de algo mais térmico e gorduroso, e bem, o travesseiro sempre esteve lá, sempre no seu lugar. O travesseiro nunca vai te trair com seu melhor amigo, nem preferir novela das oito aos meus abraços e carinhos. Os que fazem sexo com seus travesseiros, me perdoem, mas eu não sou maluco, louco ou biruta, nossa relação é puramente platônica. O único mal do travesseiro é ser substantivo masculino, nunca pega bem dizer : “eu o amo...”. O travesseiro é o substituto daquela que não existe, ainda...É aquela que está por vir. É bem verdade que (se Freud soubesse disso!) investir no travesseiro é muito mais saudável do que em um ser de seios. O travesseiro está nos esperando na outra noite, guardando um cheirinho de sono, cheiro de banho tomado, cheiro de paz. Nada de dores de cabeça, de futilidades, não há intrigas com o travesseiro. A almofada nunca vai contar para o travesseiro que te viu com outra em uma festa.
Foi assim que descobri que finalmente eu tinha um objeto preferido, ele era o meu travesseiro. É bem verdade que não era das escolhas mais criativas, eu que sempre penei para ser diferente, tive que contentar com o amor que o destino me mandou. É impressionante a capacidade que as coisas velhas tem de nos provocar carinho e doçura. No fundo eu amo meu travesseiro como quem ama uma vovozinha. Mirrado, sujo, e ainda sem espuma. Quando viajei no carnaval, levei comigo meu travesseiro, e mais uma vez na falta de um corpo (vivo, de preferência) para abraçar me contentei com ele. Foi a partir daí que se deu o pior.
Acho que se há muito não invisto em uma moça, é mais por causa da trabalheira de ter que dizer “não” em determinado momento, do que qualquer outra coisa. Não é nem tanto sentimento, tristeza, é mais chateação mesmo; afinal ter que dizer a uma mulher (já que invariavelmente é isso que se diz) que eu não estou mais a fim de dormir com ela (eu digo dormir, no sentido de ter sonhos) não é das coisas mais fáceis de se fazer na vida. É uma dessas coisas que nunca serão ensinadas a ninguém. É como espantar um cachorro que te segue. Ninguém te ensina como fazer essas coisas (Não estou a dizer que a mulher é um cachorro). Dizer para ela que foi bom enquanto durou, dizer que você vai continuar gostando dela, dizer que ela foi muito importante para você, e outras bobagens mais, não é muito agradável. Mas o pior é quando se percebe que ela está acreditando naquilo, e vai continuar no seu pé por algum tempo. Talvez seja melhor o bom e velho: “Eu estou apaixonado por sua melhor amiga”.Bem...Voltemos ao travesseiro.
O que me aconteceu foi que eu estava gripado e peguei um travesseiro mais alto, rechonchudo, novo, para deitar com a cabeça mais alta e aí desentupir meu nariz. Depois que melhorei da gripe tentei a reconciliação, mas não deu, o gordinho veio para ficar. Eu que tanto amava meu travesseiro o troquei sem maiores considerações. Esse é o problema, eu realmente amava aquela coisinha sem-graça, e bem, eu acabei me sentindo o maior dos cachorros quando percebi que o troquei por um outro só porque ele era mais gordinho. A vida é mesmo triste, quando se encontra algo que realmente amamos, acabamos sendo seduzidos por outros travesseiros. Só porque ele tem mais enchimento (Silicone), é mais novo (Ninfetinha) e mais bonita (Gatissima). É por essa e por outras que eu desisti de ser monogâmico. E no mais acabei de perceber que eu sou um babaca. Traí a única coisa que se deitou comigo pelos últimos 10 anos. Estou na fossa.

Esse é o cara.

“Já fui acusado de gostar de mulheres tristes. Não é verdade. Amo-as vivas e animais, distraídas como rolinhas e egoístas como gatos. Até me apraz que façam um certo ruído levemente aborrecido: por exemplo, tagarelam muito enquanto me ponho a pensar minhas pobres coisas.” Rubem Braga

Fabulas Fabulosas

O califa e o office-boy
Millor Fernandes

Nunca existiu , em toda a Smirna, harém mais suntuoso, nem com mais belas mulheres que o do califa El Lamourin Sahan Ibn Ifraon Ifrain Ibrain, que Alá o cubra com o lado direito do seu manto. As odaliscas de seu harém eram escolhidas pelos melhores peritos mulherengos do país , entre as mais belas circassianas, as mais meigas samarcandas , as mais gentis e educadas das dançarinas do Girá. E assim dia após dia, através do incansável rolar dos anos , numa leseira que se confundia com a própria sabedoria oriental, o califa, nos seus fofos coxins, na penumbra azul do seu salão de orgias , contemplava, em conjunto, as dezenas e dezenas de jovens que o céu, com seus imperscrutáveis desígnios , determinara para companheiras de sua breve vida material. De vez em quando o califa erguia levemente um braço, e então seu hábil auxiliar, Jamil, Office-boy do harém, jovem nubio de 18 anos, saía correndo para agarrar a mulher que o califa queria...contemplar mais de perto. Normalmente dava-se uma correria doida através dos salões do palácio, até que o jovem a conseguisse agarrar a trouxesse presa, manu militare, para o aconchego do seu soberano, que se divertia infinitamente com tal caçada. E assim se passavam os dias , e se passavam os anos . Velhos e sábios , conselheiros, baixando a voz, murmuravam ao ouvido do califa que, na luxuria ,a vida do homem se encurta naturalmente : a mulher é um veneno que destrói pouco a pouco a existência do mais pujante dos filhos de Alá. Mas o califa sorria, um sorriso fino , o sorriso de quem sorveu da fonte eterna da sabedoria. E realmente morreu bastante velho, aos 122 anos, quando todos os conselheiros de há muito já dormiam tranqüilos o sono derradeiro. Seu dedicado Office-boy , esse , coitado foi o primeiro a partir. Morreu aos 28 anos , sendo logo substituído por outro que também faleceu jovem, aos 32 anos, e por outro, que morreu as 30, e por outro, e por outro e por outro, e por outro.

MORAL DA HISTORIA: MULHER NÃO FAZ MAL. O QUE FAZ MAL É CORRER ATRÁS DELAS

Sunday, February 27, 2005

Solidão...

"Só há uma vantagem na solidão: poder ir ao banheiro com a porta aberta. Mas isto é muito pouco, para quem não tem sequer a coragem de abrir a camisa e mostrar a ferida."
Antonio Maria-

Thursday, February 24, 2005

Algumas notas que devem ser cuidadosamente desenvolvidas posteriormente, ou não.

Rafael Prosdocimi

-Eu quero uma mulher que suporte paradoxos, uma mulher que seja como diz um amigo: “dama na mesa e puta na cama”. Mas veja bem, e isso é importante, não uma mulher dama na cama, e outra mulher puta na cama, mas sim a mesma mulher. Que seja distante e próxima. Que me ame mais do qualquer outra coisa a não ser ela mesma. Uma mulher que seja como aquela de ontem à noite (ou quem sabe, e eu não me lembre, ela não é uma mesma de 13 anos atrás) um rosto lindo, morena como condiz a mulheres interessantes e paradoxais. Um olhar inteligente, mas calmo e ao mesmo tempo tentador. A escolha da roupa, como é importante saber vestir, quanto dizem as mulheres de si em suas vestes. Uma saia branca, que apesar de comprida até os tornozelos, de tecido leve, marcando suas pernas, seu quadril. Ela que apesar de magra possui aquilo que é necessário às mulheres, nádegas e peitos, sempre belos e com forte apelo gravitacional aos meus olhos. E por fim a blusa com um decote, simples, mas com toda maldade que a imagem de um decote nos trás.

-Devemos sempre observar o principio de Macgyver. O princípio de Macgyver diz:
“Aquilo que fazemos com o que dispomos, dificilmente é o mesmo que outro sujeito fará, dispondo dos mesmo recursos que você”. A questão é que o Macgyver constrói uma bomba, utilizando para esse fim uma frigideira, óleo e ovos. Você, no entanto, conseguirá unicamente realizar um ovo frito, e isso é o máximo. Ou seja, cada homem realiza o que dá conta com o que dispõe. Se assim não o fosse, todos aqueles que tivessem assistido às mesmas aulas tirariam as mesmas notas. Um prestou atenção no fato de Hitler ser ou não homossexual, outro que aquele bigodinho era muito ridículo; José achou interessante o pacto nazi-soviético de 1938; e o quarto pensava em como comer a professora através de se mostrar inteligente, prestando atenção naqueles detalhes que ela gostava, prestando atenção no fato dela se excitar dizendo certas coisas, o que não acontecia em outras horas. Ou seja, cada aluno a partir de uma mesma aula tira conclusões pessoais e subjetivas. Como diria Raul Seixas em uma gravação ao vivo e claramente chapado: “O homem tem 7 níveis de entendimento e cada um atinge o nível que alcança.”Talvez o que mais subia patamares na compreensão do fenômeno, da vida, seja o último garoto, pois o elo que o motiva a compreender a história da segunda guerra, é a vontade de comer a professora. E comer a professora, representa um quantum enorme de afeto, único medida possível da Vontade na vida, ou um puta reforçador primário, como diria um comportamentalista. O ultimo aluno fará qualquer coisa para conhecer tudo aquilo que a professora conhece e gosta, talvez tentar conhecer mais do que ela mesma. Mas esse assunto rende muito e já vou passar para a próxima nota.

-O filme que mais me abalou em toda a minha vida. O filme que teve essa proeza foi “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembrança”. O filme tem como tema a dor da separação e da saudade. O filme diz de terminar relacionamentos o que, para mim, é essencial no presente momento de minha vida. Não que eu precise terminar algum relacionamento, elas é que precisam. Apesar do final piegas e romântico demais, a idéia do filme (relembrando obviamente o principio de Macgyver, ou seja, a idéia do filme para mim) é que a vida é triste, separar das pessoas que amamos, ou achamos que amamos, é muito triste, mas que sem essa tristeza não há mais felicidade, não há beleza. Algo que o Vinicius e o Nietzsche sabiam bem. O filme, nesse sentido, é antes de tudo pedagógico. Alguns dizem que é ficção cientifica, para mim é uma história linda sobre o ser humano, sobre remédios, sobre “evitadores de conflito”, sobre o vazio da vida. Não há nenhum elemento cibernético no filme, e a parte ficcional é apresentada sem muito alarde, ou seja, a hipótese (absurda) de lavar de nossa mente lembranças de pessoas que deixaram de ser queridas, não é a força do filme. Apesar da possibilidade, e da teoria idiotizante de que há no amor algo que faz brilhar inclusive uma mente sem lembrança, penso que o que é lindo, e mais fundamental, é de como nos dispomos de todos os recursos contra a tristeza de nossa vida, como se ela não fosse elemento constituinte de nosso ser. “E todo grande amor só é bem grande se for triste(...)assim como o poeta só é grande se sofrer etc...”. Já cantaria Vinicius de Moraes.
Saí do filme meio bambo, meio sem rumo. Lembro-me do perigo que foi a minha presença dirigindo aquele dia, e ainda dizem que é perigoso dirigir completamente alcoolizado. E emocionado então, e triste hein??!

-Devemos aprende a bater palma direito. Se eu tiver que ensinar algo, a qualquer pessoa, que seja isso: “Se não sabes fazer nada, aprenda pelo menos a bater palma direito, na hora certa, sobretudo, para as coisas certas.”

-Mulheres minimamente belas ou belas tardias. Quando uma pessoa utiliza uma alta percentagem de tempo e glicose, parado em um quarto, com uma questão em mente, uma pergunta. Podemos dizer que importa pouco a qualidade da resposta para o nosso homem reflexivo. Ou seja, o que importa é pouco se a solução para o problema é satisfatória para a comunidade pensante, se satisfaz os requisitos racionais, e mais quanto tempo durou a reflexão, e quanto de energia e tristeza se gastou. O maior tempo de reflexão diz das considerações, e das defesas possíveis contra negativas que a resposta já encontrada irá receber. Para ser claro depois de tanta enrolação.
Por que nunca amei fêmeas da mais alta linhagem, de mais garbosa aparência? Essa era a pergunta. Não que todas elas fossem feias, algumas eram bonitas, mas não eram lindas, espetaculares. A resposta é que as mulheres muito bonitas se desenvolvem medianamente. Pois as belas penas não fazem com que elas pensem em saídas mentais, culturais para a conquista do macho em questão. Ou seja, mulheres bonitas, desde sempre bonitas, não encontram dificuldade para serem quistas, logo sem dificuldade aparente, elas não se desenvolvem em outros campos. É por isso que diferenciei mulheres belas e belas tardias. As belas tardias talvez sejam o mais lindo exemplar de mulheres possíveis. A beleza estética e a graça no olhar e no jeito de fechar e abrir a boca, com respectiva importância aos sons que daí depreendem. É claro que o buraco é mais embaixo (sem maldade), algumas mulheres feias ao invés de se desenvolverem no sentido de procurar construir artífices de sedução, desenvolvem um certo ódio consigo mesmas, contra a beleza da vida e contra tudo. Mesquinhas e velhas por antecipação. E quando dizemos feias, belas e belas tardias, digo mais da impressão social que a visão de tais senhoritas causam aos olhos dos querentes. Ou seja, uma mulher bela, desde a infância, é uma que sempre foi querida por todos. Uma bela tardia, por sua vez era preterida em razão de outras, no passado. Seu futuro pode ser lindo. De domínio das faculdades da solidão, e das capacidades que só os que foram feios têm, de sobreviver sem outros seres humanos por algum período de tempo, ela controla sua beleza. Controla seu impulso, escolhe quem quer, o que quer. Isso tudo, e é o mais importante, com graça e encanto. São as que te enganam, e você não chega nem a achar ruim, como quem percebe que ter sido enganado, ou seja, ter produzido uma ação em uma mulher charmosa e bela foi o auge de sua existência. Como são raras as belas tardias, charmosas e estupidamente cheias de vida. Ou seja, posso dizer que só me interesso por mulheres que foram desinteressantes aos 10 anos de idade.


-A infância termina quando começa a punheta. Quando começamos a nos masturbar acaba-se a infância. Sem julgamento de valor, do tipo, infância: “linda, pura e serena” e punheta: “pecado, sujeira”. Nem sei explicar isso direito, mas em mim coincide quando parei de pedir ajuda pras pessoas e parei de chorar, com a época em que comecei a prolongar meus banhos. Talvez Lacan e o resto da gangue tenham respostas, ou pelo menos eles devem achar que tem, eu não sei.

quem sabe amanhã

Rafael Prosdocimi

Eu queria vê-la amanhã. E queria que logo de cara eu dissesse algo bonito para ela. “Ei”, diria eu, e esperaria que ela voltasse algo do tipo, mas que nessas duas letras como resposta, houvesse toda a malícia do mundo. Queria que nessa fala, tudo o que não tivemos, por obra de babaquice de quem vos fala e do cruel acaso, fosse possível. Queria que nesse “Ei”, ela olhasse para os meus olhos, e esse contato a deixaria sem-graça, e então ela pousaria os olhos no chão, e tentaria esconder um lindo sorriso, desses bem bobos. O que deixaria tudo ainda mais singelo. Ficaríamos talvez numa utopia distante a ficar olhando um pro outro e somente diríamos coisas em olhar, cada um pensando, sem pressa, em palavras para expressar a satisfação, não encontrando as danadas, mas tendo o prazer de ter encontrado retorno a um olhar já perdido, já sem esperança. Depois de uns minutos a convidaria para tomar um café na cantina, ela provavelmente teria alguma aula importante, dessas que não se pode perder, mas iria comigo. Eu já, nessa mania idiota de viver de sensações e possibilidades, me perdia, e já pensava que meu dia não poderia ficar melhor. Há algum tempo esperava uma retribuição ocular.
Sentíamos que seria difícil deixarmos ir embora.
Na cantina sentaríamos e tomaríamos nosso café. Ela seria uma futura socióloga, valente menina, inteligente e risonha, com uma risada muito debochada, muito ácida. Eu, que nunca gostei muito de mulheres debochadas e barulhentas demais, mas admirava pessoas ácidas, sentia que até aquela risada estrondosa me fazia sentir tranqüilo. Tentaríamos nos olhar, mas algumas pessoas tentariam nos atrapalhar e interromper com palavras o que acontecia em silencio. Penso que seria inveja dessa gente que precisa falar. Aquisição recente da evolução humana. Dizem uns que é a linguagem que caracteriza o ser humano. Penso que são os gemidos que caracterizam o ser humano. E quão rico não seria alguém que decodificasse os gemidos. Não é à toa que nos momentos de prazer e dor gememos. A linguagem serve apenas como intervalo entre a cama e a lama. Reduto da vida. Gemendo e chorando é assim que vejo o homem e a mulher. Sem isso não somos seres humanos. Se assim o fosse, diriam alguns, não seríamos diferentes dos ratos. Penso que os ratos não querem se diferenciar de minhocas. E sei o que me faz humano.
Eu perguntaria se poderia ligar para ela. Ela diria que sim. Mas, de novo o sim importaria nada em nossos gestos no ar. E ficaríamos assim em silencio, por algum tempo, sem incômodo algum. Talvez alguém de longe acharia estranho. Um amigo chegaria fazendo barulho. Dizendo, falando. E eu aí lembraria de uma musica do Luis Melodia...”se a gente falasse menos, talvez compreendesse mais...”.

Wednesday, February 23, 2005

Um pouco de romantismo.

“Amar é...ser a primeira a reconhecer o corpo dele no Instituto Medico Legal.”—Ivan Lessa.

Um encontro absurdo

O encontro se deu em uma noite de sábado, no Reino Encantado do Estereótipo, um lugar lindo, maravilhoso, onde tudo é estereótipo e costume, desde a princesa que vive na alta torre e espera por um príncipe, até a velha bruxa que impede a felicidade “para sempre” da princesa, mas nem a bruxa sabe o porquê disso tudo. De qualquer forma lá vivia a Patricinha, filha da senhora Perua com o senhor Velho Cheio da Grana Que Está para Morrer, e o Intelectual, filho da Comunista com o Professor Universitário. O que importa nessa estória é que esses dois se encontraram, por razões que nem a mais alevantada imaginação poderia conceber, o que de fato não importa no desenrolar da trama. Mas de fato o Intelectual conhecia a Menina Vulgar que era prima da Patricinha, por parte de mãe, e a Vulgar achou que seria um bom encontro entre o intelectual e a Pat. A Vulgar era irmã mais nova do Menino Burro.
Chegaram ao restaurante separados, ela no seu carro novo e ele de bicicleta, não que fosse um atleta, como eu disse antes ele era o Intelectual. A bicicleta, segundo o próprio, é um meio de transporte não poluente, e de acordo com seus cálculos, a poluição haveria de consumir o Reino em 204 anos. Ela já haveria morrido até ai, pensava nossa intrépida personagem. Sendo assim não importava muito que poluíssem o Reino, ela não estaria lá mesmo.
Ele queria uma mesa para não-fumantes, ela queria para fumantes. Sentaram em uma mesa que se encontrava no meio dos dois espaços.
- Por favor um vinho nacional – disse o intelectual.
- De forma alguma só bebo estrangeiro. São os melhores vinhos. Os daqui são de péssima qualidade. Retrucou a mocinha,
- Os daqui só são péssimos, porque ninguém os bebe, se todos bebessem o vinho nacional ele iria melhorar a qualidade...-o intelectual então ministrou uma aula de economia em vinte minutos.
Dessa aula nossa amiga só entendeu que ela deveria tomar vinho péssimo para que alguém no futuro tomasse vinho mais barato e de boa qualidade, o que de fato não a agradou. Continuaram a “conversar”.

O intelectual ajeitou os óculos que cismavam em cair no nariz, e que ele achava um charme, mas ela não. Ao ajeitar os óculos ele visualizou os seios pós-siliconados da Patricinha e suas pernas torneadas por 3 horas de academia, o que ela achava lindo, e ele também. Ele então tentou puxar papo.
- Mas e você gosta de ouvir o que ?
- Eu gosto muito do Junior, da Sandy, da Britney e Do N’sync.
- Junior você diz o Fabio Júnior?
- Eu to falando da dupla Sandy e Junior, além do mais o Fabio Junior é ator da globo, que aliás tem o maior rolo com a Patrícia de Sabrit, que voce sabia é quase 20 anos mais nova que ele...blábláblá...- Em meia hora se descreveu todo o circo de relacionamento do meio “artístico” nacional. Afinal todo mundo rodava com todo mundo. A maior camaradagem.- O intelectual se fingiu de interessado, mas há muito tempo não ouvia tanta bobagem assim.
- Bem e você, gosta de que tipo de música ? Disse a gatinha...
- Eu gosto muito do Raul, dos Beatles , Led Zeppelin, e dos mutantes , mas a primeira fase, depois eles ficaram meio pop.
- Eu também adoro a Vampira.
- Mas quem é essa ??
- A vampira dos Xmen. Você não disse que gosta dos mutantes? Eu também gosto, mas gosto mais da Vampira.
- Mutantes é uma banda de música. Foi uma inovação na época, meio que abriu as portas para o rock’roll nacional. Tinha até a Rita Lee.
- Sério...A Rita Lee tinha uma banda??
- Claro... foi o maior sucesso.
- Eu também gosto muito daquela música dos Beatles. Satisfaction.
- Não... isso é Rolling Stones. Você ta confundindo tudo.

O intelectual já pensava com sua boina – que ela achava ridícula, porque de fato era ridícula- “...se ela não fosse tão gostosa eu já tinha me mandado...”
A moça estava com a impressão de que conversava com seu pai. E aquela boina na cabeça, será que devo avisar que está ridículo, pensava ela...

- Já vi que nossos gostos musicais são bem diferentes- Comentou a moça.
- É...mas eu não acredito em gosto musicais , para mim a cultura de tal pessoa reflete o grau de inserção intelectual ...-Mais uma aula de sociologia do garoto. A moça se lembrou do velho professor careca de sociologia da faculdade de direito.
- Anh...- O primeiro comentário inteligente da Patricinha.
- Você gosta de TV? emendou a mesma.
- Eu vejo muitos filmes, alguns documentários, principalmente sobre a vida marinha e sobre as religiões orientais.
- Eu também gostei muito do Dalai Lama, vi outro dia ele no programa da Ana Maria. Ele é demais.
- Mas eu prefiro ler. E você gosta de ver o que na Tv?
- Olha ...eu gosto de tudo, novelas , menos essas das 6 que é muito fraquinha, Faustão, Xuxa, todos os programas de beleza...-15 minutos de minuciosa descrição televisiva.
- Ler?
- Contigo, caras, Istoé- gente. E você
- Tolstoi, Freud, Garcia Márquez, todas as tragédias gregas.
- Cinema?
- Adoro suspense. Mas gosto de comédia também. O melhor filme que eu já vi foi : “As patricinhas de Beverly Hills”, aquele filme é tudo.
- Gosto de iranianos. Os franceses também são muito bons. Os brasileiros melhoraram muito. Mas “Casablanca” é imbatível.
- Não é lá que mora o presidente dos EUA?
- Lá onde ?
- Na “Casablanca”.
- Casabranca você diz. Casablanca é o nome de um filme antigo- Nossa, mas que anta. O intelectual costumava pensar que não deveria perder seu tempo com quem não havia visto Casablanca. Mas ...bem...ela tinha silicone nos seios. Ele concordou que nunca mais daria atenção para uma moca que não havia visto Casablanca, salvo se a mesma tiver um corpo escultural.
- Bebida ?
- Champagne, Scotch...12 anos.
- Só cerveja e às vezes um vinho.
Os dois começaram a se irritar um com o outro, nada parecia interessar aos dois. O papo simplesmente não fluía. O intelectual estava nervoso, pensara ter encontrado seu inimigo numero um. A patricinha só não entendia como aquele individuo ainda estava vivo...e as roupas dele que horror, nada mais barato. Nenhum Calvin, Tommy ou Oakley. Ele então tomou as rédeas da conversa:
- E sexo...?
- Como? Oi? Hum? Fingiu ela não ter entendido a pergunta.
- Gosta de transar...Sabe... fazer sexo?
- Sim...é claro. Respondeu ela, um tanto tímida, mas feliz por ter achado algo que ambos concordassem.
- Que bom...eu também.
- Já que nós não podemos ir a um show de música juntos, não podemos ir ao cinema, nem ver nada na tv, arrematou o intelectual malandro, podemos trepar qualquer dia desses, o que você acha?
- É ...bem...não é uma má idéia.
- Então vamos agora mesmo.

Seguiram para o motel. Ele nem acreditava olhando praquela escultura natural, bem... nem tão natural assim. Ambos pelados , disse ela:

- Tá... mas eu fico por baixo...
- Ah não... fica em cima.

Tuesday, February 22, 2005

Tédio

Se o tédio consistisse nessa espera da chuva, nada seria insuportável. Mas se o tédio prepara apenas o próximo tédio, apenas mudando em cor e traço o que permanece em forma e conteúdo. Se meu olho brilhasse mais eu não andava por aí de olhos meio fechados. Se os raros momentos de felicidade, ou o que seja, fossem ocorrer agora eu pararia essa caneta no meio da letra “a” sem pudor ou vaidade. Esqueceria esses termos em um segundo, pois esses termos só me assombram em tédio e angustia, sendo a ultima ainda sim preferível. Se você sentasse comigo e se houvesse um mínimo de vontade de mistério eu perderia o que anda me assombrando, mas que infelizmente não chega nem a dar medo.

Monday, February 21, 2005

A ciencia do sexo.

Rafael Prosdocimi

Este ensaio não tem por finalidade, provocar controvérsias no meio cientifico e muito menos provar qualquer coisa, é meramente uma analise perturbadora, de como a ciência está presente no “ato”, ou de como o sexo influencia a cabeça dos cientistas ( o que é mais provável). Isso demonstra de vez, que nem todos os cientistas são seres assexuados, é só a grande maioria , mas não todos.
Na nossa primeira relação, voltemos a Newton, que como todos sabem morreu virgem. Deve ter sido talvez a falta de sexo, que o levasse a ficar em baixo de macieiras vendo a grama crescer... até que ...pimba, cai uma maçã na sua cabeça e aí se torna possível ir pra lua.
Mesmo a partir de uma teoria totalmente assexuada, podemos fazer demonstrações sexuais, provando como o sexo está presente, ate quando se pensa este ausente, para delírio da massa psicanalítica. Uma derivação da teoria newtoniana é que o tamanho dos corpos altera a força gravitacional entre esses corpos. É por essa razão, que dois seios de enormes proporções normalmente se encontram juntos no sutiã. E também essa é a explicação, para aquele “pala” que você deu; quando no primeiro encontro, com aquela gata turbinada, sua mão foi direto na comissão de frente. Você, como que sem saber o que falar, disse : “não sei como isso aconteceu...”, não se culpe. Realmente foi involuntário, pura atração gravitacional.
Pulemos agora para Einstein e a sua relatividade. Nesse estudo fica claro, a influência do sexo na cabeça genial, e como veremos pornográfica, desse grande homem. A relatividade especifica de Einstein quer apenas demonstrar, como o ato sexual é pura e simplesmente especifico a duas pessoas, sendo, portanto, dispensável os comentários sobre suas peripécias sexuais, já que elas se referem ao casal e está restrito ao mesmo. A relatividade geral de Einstein, cortando os ss, quer demonstrar, que o sexo é relativo a generalidade de sua historia. Ou seja, você só pode analisar uma transa se baseando em transas anteriores. Isso fica claramente demonstrado, utilizando o “teorema de fók” que diz : “sexo quando é bom é ótimo e quando é ruim ainda assim é muito bom”. E por essa razão você só pode falar que tal relação foi boa, tendo por base uma amostra anterior satisfatória, que foi calculada em torno de 45 pessoas, dentro de uma amostra randômica. Sendo então cientificamente provado que casar virgem é um impropério completo e total. Simplificando : faça muito sexo, com muitas pessoas , igual aquela propaganda da Nike “just do it”.
Eu poderia agora vir a falar sobre o conceito envolvendo a ação da“chave-fechadura”que envolve as enzimas, mas ai como diria Arnaldo Cezar Coelho “ a analogia é clara”. Acho que não se faz necessária nenhuma explicação. Ainda tem aquelas cadeias de dupla hélice do DNA, nada poderia lembrar mais o ato sexual, aquela fitas se cruzando indefinidamente é quase um sexo tântrico.
Agora me volto à metafísica, para demonstrar a ultima grande teoria sexual, essa de minha autoria. No taoísmo a grande iluminação esta na confluência das forças, no meio do caminho , no Yin e Yang, noite e dia, vida e morte. Sendo assim o grande caminho, ou a “iluminação do sexo”( no sentido literal) está no meio do caminho, ou seja no meio termo entre luzes acesas e breu completo. A penumbra, a deliciosa iluminação de uma vela acesa, ou de uma luz no corredor ou ainda melhor, a luz da lua entrando pela janela e deixando claro toda a beleza da mulher, escondendo-lhe aqueles mínimos detalhes que tiram o clima Hollywood do sexo. Jogue fora suas playboys e comece a ir ao banheiro, para aqueles banhos de 40 minutos, com seu livro de ciências da oitava serie.

Nietzsche...

Os perigosos entre os subversivos – Podemos dividir os que pretendem uma subversão da sociedade entre aqueles que desejam alcançar algo para si e aqueles que o desejam para seus filhos e netos. Esses últimos são os mais perigosos porque; porque têm a fé e a boa consciência do desinteresse. OS DEMAIS PODEM SER CONTENTADOS COM UM OSSO : a sociedade dominante é rica e inteligente o bastante para isso. O perigo começa quando os objetivos se tornam impessoais; os revolucionários movidos por interesse impessoal podem considerar todos os defensores da ordem vigente como pessoalmente interessados, sentido-se então superior a eles.

Certas Esperanças

Sergio Porto.

É preciso — é mais do que preciso, é forçoso — dar boas festas, trocar embrulhinhos, querer mais intensamente, oferecer com mais prodigalidade, manter o sorriso e, acima de tudo, esquecer tristezas e saudades.

Façamos um supremo esforço para lembrar e sermos lembrados, porque assim manda a tradição e é difícil esquecer à tradição. Enviemos cartões e telegramas de felicitações àqueles que amamos e também àqueles que — sabemos perfeitamente — não gostam da gente. O Correio, nesta época do ano, finge-se de eficiente e já lá tem prontos impressos para que desejemos coisas boas aos outros, nivelando a todos em nossos augúrios.

Depois de abraçar e ser abraçado, desejar sincera e indiferentemente, embrulhar e desembrulhar presentes, cada um poderá fazer votos a si mesmo, desejar para si o que bem entender. Subindo na escala das idades, este sonhou todo o mês com um trenzinho elétrico, aquele com uma bicicleta (com farol e tudo), o outro certa moça, mais além um quarto sonhador esteve a remoer a idéia de ser ministro e o rico... bem, o rico só pensa em ser mais rico. O rico detesta amistosamente os ministros, já não tem olhos para a graça da moça, pernas para pedalar uma bicicleta e, muito menos, tempo para brincar com um trenzinho.
Dos planos de cada um, pouquíssimos serão transformados em realidade. Alguns hão de abandoná-los por desleixo e a maioria, mal o ano de 56 começar, não pensará mais nele, por pura desesperança. O melhor, portanto, é não fazer planos. Desejar somente, posto que isso sim, é humano e acalentador.
De minha parte estou disposto a esquecer todas as passadas amarguras, tudo que o destino me arranjou de ruim neste ano que finda. Ficarei somente com as lembranças do que me foi grato e me foi bom.
No mais, desejarei ficar como estou porque, se não é o que há de melhor, também não é tão ruim assim e, tudo somado, ficaram gratas alegrias. Que Deus me proporcione as coisas que sempre me foram gratas e que — Ele sabe — não chegam a fazer de mim um ambicioso.
Que não me falte aquele almoço honesto dos sábados (único almoço comível na semana), com aquele feijão que só a negra Almira sabe fazer; que não me falte o arroz e a cerveja — é muito importante a cerveja, meu Deus! —, como é importante manter em dia o ordenado da Almira.
Se não me for dado comparecer às grandes noites de gala, que fazer? Resta-me o melhor, afinal, que é esticar de vez em quando por aí, transformando em festa uma noite que poderia ser de sono.
E para os pequenos gostos pessoais, que me reste sensibilidade bastante para entretê-las. Ai de mim se começo a não achar mais graça nos pequenos gostos pessoais. Que o perfume do sabonete, no banho matinal, seja sempre violeta; que haja um cigarro forte para depois do café; uma camisa limpa para vestir; um terno que pode não ser novo, mas que também não esteja amarrotado. Uma vez ou outra, acredito que não me fará mal um filme da Lollobrigida, nem um uísque com gelo ou — digamos — uma valsa.
Nada de coisas impossíveis para que a vida possa ser mais bem vivida. Apenas uma praia para janeiro, uma fantasia para fevereiro, um conhaque para junho, um livro para agosto e as mesmas vontades para dezembro.
No mais, continuarei a manter certas esperanças inconfessáveis porém passíveis — e quanto — de acontecerem.

A crônica acima foi publicada na revista "Manchete" nº. 193, de 31.12.55.

Sunday, February 20, 2005

De sair e ter medo

Rafael Prosdocimi

Ontem, antes de sair de casa, eu me olhei no espelho 43 vezes. Verifiquei se estava com a chave do carro 12, passei 5 vezes o desodorante, despedi-me de mamãe umas 4 vezes e quase cheguei a blasfêmia de rezar. Isso porque eu estava com medo. Não ia de encontro com a morte, o perigo, ou ao meu casamento. Ia ao encontro de colegas que não via há mais de uma década.
Eu cheguei na casa da reunião muito rápido, pensei, queria ter me perdido no caminho e ter demorado mais, que é pro espírito se acostumar com a idéia desse reencontro com tanta gente de um tempo que eu era menos rígido, menos estúpido, menos medíocre, um eterno tornar a ser qualquer coisa. Meditei um pouco, vi que não havia nada a fazer, eu estava ali. Foi aí que entrei...e vi de cara um rosto conhecido...Ufa!
O melhor desse dia não foi ter visto rostos que marcaram tanto a minha vida (apesar dela não ter ido); de lembrar que “éramos felizes e sabíamos”, só não se sabia, ou não se entendia, que isso tudo passava; de relembrar casos que pareciam dormidos em minha mente. O melhor foi sem dúvida o cheiro, o gosto, a possibilidade de vida nesse encontro. O cheiro de infância, o cheiro de algo que está por vir, a idéia, nesse encontro, de que a vida é uma possibilidade linda e futura, de que há um mundo tão belo e encantado por vir. Época na qual ir a uma festa, sair de casa, uma caminhada, era um evento que tomava proporções de monopólio da conversa com todas as pessoas de casa, no café da manhã. Não esse, agora, sentimento de eterna repetição que todas as festas, todos os encontros me causam. Com suas rodas de papo já definidas, seres estáticos e modorrentos, chatice em todos os níveis. Festas que cansam mais do que fazem iluminar, surgir algo novo. Festa não dos seres humanos, mas da vida mesquinha e medíocre, com suas bebidas contadas, suas horas de acabar, a vontade de ordem imperando. Festa e ordem, palavras inimigas. Há alguns meses eu matei sábado a noite. Matei essas noites tão iguais e tão sem graça. Nunca mais havia sentido esse medo de chegar em algum lugar, encontrar pessoas que não via há 13 anos, saber de quem vou me lembrar e de quem se lembrará de mim. Perceber como eu nunca tinha visto essa tão linda menina, tão singela, charmosa, cativante. Esse nervosismo, que não sentia há muito tempo, talvez desde quando recebi o “sim” dela outra quando esperava um “não”, e nem mesmo quando aquela baixinha queria que eu a levasse ao motel e eu muito metido a menino, hesitei e fiquei nervoso. Mas foi de uma qualidade diferente. Um nervosismo menos especial.
Tenho certeza que defini com esses colegas todos os meus amigos futuros, defini todas as formas de me apaixonar, defini como levaria foras pelo resto de minha vida. Não tenho dúvidas de que algo foi ali cristalizado, naquela escola, com aquelas pessoas ao redor. Para vocês que pensam ser isso bobagem, ou seja, que pensam que as pessoas mudam a toda hora. Pessoas que não acreditam que uma fase seja mais importante que outra, eu digo que dos meus 4 aos 10 anos eu defini que largaria física, que faria psicologia, que seria um apaixonado por professoras e que elas se apaixonariam por mim. Foi ali, naquele prédio, que comecei a adiar prazeres, comecei a me arruinar com meus êxitos. E se você, não acredita nisso que digo agora, tudo bem, porque eu aposto que você crê em Deus, e até não crer em Deus já estava em minha cabeça ali no Balão. Não digo de forma alguma que a vida lá fora nada significou, só que foi naquele tempo, naquele tempo brincando, ali quando se levava a vida de forma atemporal, mágica, sem preocupações, foi ali que eu defini como lidaria com minhas preocupações. É por isso talvez, que esse retorno me seja tão nostálgico, tão lindo, pois foi ali que a ação realmente aconteceu, foi ali entre “Comandos em Ação” e argila, que eu construí a vontade de conhecer o mundo e de tentar mexer na vida. Foi ali que percebi como sempre me apaixonaria por mulheres caladas, quietas, mas inteligentes e fundamentalmente solitárias.

a sacada da publicidade

“O grande fracasso da esquerda foi ter passado anos vendendo ideologia, enquanto a direita vendia desejo”.-Cacá Diegues

Wednesday, February 16, 2005

Sempre tão óbvio e igual

Fui correr um pouco, correr pra ver se esse corpo e essa mente se cansam um pouco e desistem de pensar. Quero um sono de verdade desses que só as pessoas que trabalham possuem. Talvez seja só pra isso que exista o esporte, ou seja, proporcionar cansaço a quem não trabalha, e junto com o cansaço aquela sensação de que valeu o dia.
Estava sentado no banco da praça e tentava me convencer a fazer uns abdominais, sem muito sucesso, quando vi a cena. Uma cena tão óbvia e igual a todas as outras que a idéia de fazer abdominal sumiu de minha cabeça. Era uma cena, que se for descrita em letras não proporcionará a certeza que tive (do que acontecia ali) ao olhar. Pois digo que eram duas pessoas, um homem e uma mulher se abraçando. Estavam a 20 metros de distancia de uma pessoa normal, como sou míope, estavam eles a talvez 35 metros do meu ser. Mas não eram duas pessoas se abraçando e sim o seu contrário...Duas pessoas que abraçadas se separavam. Vi que elas estavam se separando de uma forma tão óbvia e clara que até assustei. Não durou mais de um segundo, entre ver a cena e perceber que aquele abraço era um abraço de despedida. Não sei, e talvez nunca saiba, como percebi isso de forma tão rápida. O resto do tempo que observei a cena, somente comprovou o que vi no primeiro momento. Uma separação tão óbvia, igual e dolorosa como a todas as outras na vida.
Um abraço forte, apertado...Um beijo na bochecha com pressão além da conta...Uma mão que bate nas costas como a consolar...Uma face que toca de lado a outra...Um olhar para o chão...Uma mão que espalha as lágrimas pelo rosto...
Esse abraço tão apertado, tão indisposto a deixar o outro organismo se ir. Esse beijo como a tentar marcar no corpo em uns segundos o que não marcara por anos. E essa mão nas costas, batendo, acariciando, da mesma forma como consolamos nossas crianças.
Essa força, que não houve quando juntos, vem agora na separação. Nesse contato facial, provavelmente as lágrimas se tocam, se misturam. Uma lágrima tão cínica quanto forçada se junta à outra sempre tão machucada, muda. E sempre é assim, não nos enganemos, se é a nossa lágrima a doída, saiba que a outra é cínica e atrasada.
Na cabeça dele o sábado que vem, a cerveja, o próximo carnaval compensando esse ultimo de tédio e preguiça. Nessa mesma mente já desponta uma provável menina, uma provável que seja tão fácil quanto tola. Na cabeça dela flutuam outros pensamentos...”o que fiz de errado, como consertar a situação”, “como reconquistar”. Mas podemos trocar a vontade, nesse parágrafo, “ele” por “ela”, ou “ela” por “ele”, e todas as combinações genéricas possíveis. Eu prefiro da forma como coloquei por razões biográficas. Que possamos ser menos hipócritas, pelo menos ao escrever. Mas tudo sempre igual. Relacionamentos heterossexuais, ou homo, de longa data ou curto; a separação entre maridos e mulheres ou mesmo entre maridos e amantes. Jovens e velhos ou velhos e jovens. Uma lágrima sempre tão falsa e a outra tão dolorosa. E se a falsa lágrima finge dor, assim o pede a lágrima que sofre. Pedimos tanta ilusão e falsidade na vida que a sinceridade nesses momentos seria a morte. E depois vamos ainda dizer a todos que a separação foi decidida pelos dois, pois ambos acharam que não estava dando mais. Diremos sempre de separações amistosas e que não houve um que quis, foi os dois que assim decidiram. Tão mentirosas palavras quanto necessárias. E nesses momentos, quando sabemos de separações, o que queremos saber, com todas as seguintes e indispensáveis letras é: “Quem deu o pé na bunda de quem?”, frase que se perde em uma longa cadeia de hipocrisia e eufemismo.

Nietzsche, saúde- amén.

-“ ‘Deus’ imortalidade da alma’, ‘salvação’, ‘além’ são simples conceitos aos quais não dediquei atenção , ou tempo, nem sequer em criança- talvez eu não fosse já então bastante infantil para tal? Não considero o ateísmo como resultado, e ainda menos como um fato; para mim, o ateísmo é forma estrutural de ser. Sou demasiado curioso, demasiado problemático, demasiado orgulhoso, para contentar-me com respostas grosseiras, uma indelicadeza para nós outros, pensadores: no fundo, é simples grosseira proibição. É o mesmo que dizer-nos. Não deveis pensar!...” p.36-
Ecce Homo-ou como se chega a ser o que se é. Nietzsche, F.

Tuesday, February 15, 2005

A moça do ombro.

Rafael Prosdocimi Bacelar

Hoje foi apenas mais um dia na minha vida, nesse veloz ano de 2003. Depois dizem que os anos não andam passando mais depressa. Ainda me lembro da minha ultima passagem de ano, eu junto com Jack Nicholson e o índio gigante que se fingia de doido e de surdo-mudo, passamos juntos; apesar dos dois ficarem todo tempo do outro lado da televisão (é... a televisão tem um lado de lá). Fiquei nesse reveillon, sensivelmente o pior de minha breve existência, tomando coca-cola light (sem gás), que havia sobrado do Natal, e comendo um strogonoff de frango, que se recusava terminantemente a se acabar. Todos fora de casa, todos os amigos viajando, sendo assim, esse ano-novo foi apenas a preliminar de meu ano, que pode ser resumido em um grande copo de coca-cola light (sem gás).
Hoje eu voltava de ônibus para casa, já que na aula iria passar o filme “Meu pé-esquerdo”, e de deprimido eu já chego de mim mesmo. Além disso, ver um filme em uma sala lotada de gente que respira, esse ar abafado, vendo em uma tela de 14 polegadas, a 5 metros de distancia, me soa um (com o perdão da palavra) puta amadorismo. É como só tomar cerveja no sábado à tarde, ou almoçar no domingo ao meio dia.
Esperava tranqüilamente meu ônibus, ou o que quer que seja essa geringonça azul, que às vezes me lembra mais uma sauna de pobre ou mesmo uma criação particular de bactérias ao ar preso . De qualquer forma eu gosto de ônibus, já que nele podemos ver a vida em seu estado mais puro, sujo, puto e simples. Foi nessa algazarra que ela entrou. Era uma dessas típicas moças mais simples, que se disfarçam de madames, visto que a vistosa plumagem, e as formas anato-morfo-geograficas acabam ajudando. Essa era linda. Uma pele num tom moreno claro, o cabelo castanho com mechas louras, e uma cara de mulher decidida, decidida a casar com alguém que tome todas as decisões pra ela, deixando-a a curtir. Usava uma calça jeans que era justa (ou parecia muito justa, pra falar a verdade era justíssima) e uma blusa que em qualquer outro ser de ovários ficaria muito barango, mas nela parecia um manto sacerdotal, de alguma deusa-rainha-princesa do Egito, ou da Índia. Era um tecido meio de seda (sintético) colorido, lembrando uma tigresa. Essa mulher , talvez ela mesmo não sabia, me torturou violentamente , por exatos 37 minutos (no relógio) , infindáveis horas em minha mente, já que a mesma deixou um de seus ombros a mostra, impunemente. Seus ombros eram perfeitos , sem serem ossudos e sem que apareçam pelancas, ombros que eu queria para mim, nesse natal. Faltava algumas pintinhas nesse ombro, mas a verdade é que a vida as vezes é assim mesmo, linda, delicada, mesmo sem pintinhas, porque afinal “rapadura é doce, mas não é mole, não”, já diria um monge budista no sertão nordestino.
De qualquer forma essa mulher contrastava violentamente com esse ônibus. Intrigado com esse contraste eu pensei em algumas medidas que tomaria, caso fosse vereador, prefeito, governador ou só muito rico mesmo. Eu baixaria uma lei proibindo mulheres dessa estirpe a andarem de ônibus, carros seriam destinados a leva-las onde bem entenderem. Um motorista ficaria parado em cada ponto de ônibus, com um outro sujeito (devidamente treinado) como“Selecionador de beldades, cheirosas e maquiadas que não podem se sujeitar às imundícies de um ônibus suado e sujo”. Ou então eu proporia uma outra lei, ainda melhor, que pagaria às moças como essa, para andarem de ônibus, visto que as mesmas fazem a alegria da rapaziada, e tem um importante papel na coerção e manutenção social.
Ainda havia um singelo lenço de papel, que a mesma passava no rosto suado, mas esse assunto eu deixo pro pessoal da filosofia.

Monday, February 14, 2005

FRASE DAS 14:47

"Uma vida inteira de felicidade? Ninguém agüentaria: seria o inferno na terra"
-Bernard Shaw.

Saturday, February 12, 2005

Rubem Braga

Ginástica ---
Rubem Braga
Foi denunciado ao Tribunal de Segurança o contramestre de uma fábrica de tecidos de São Paulo que é acusado de “greve branca”. Isto consiste – diz o jornal- em provocar o desgaste da maquinaria. Apesar de não diminuir a produção da fábrica, o contramestre teria feito com que se alterasse a sua qualidade, tornando-a inferior, e se desgastassem as engrenagens, o que é um sério prejuízo em um momento em que a importação é tão difícil.
Está visto que eu não sei se a acusação é verdadeira. Deve, em todo o caso, ser uma acusação difícil de provar. É verdade que o Tribunal de Segurança, sendo um tribunal de exceção, acima ou fora das regras jurídicas vulgares, do gênero das que ingenuamente me dei ao trabalho de aprender (ou “colar”) nos saudosos tempos da Faculdade, lavras suas sentenças muito mais à vontade que uma corte de justiça comum. Não será de admirar, portanto que o homem vá para a cadeia. Se realmente praticou o crime, nada me parece mais justo. Um crime contra as máquinas é sempre uma coisa repugnante, pois as máquinas não devem ser culpadas das extorsões e opressões que os homens praticam, utilizando-as.
E nós, no Brasil, temos bem poucas máquinas para que nos possamos dar ao luxo de estragá-las. O tipo mais abundante de máquinas que possuímos -e assim mesmo em número inferior ao necessário - é dessas máquinas a que chamaremos, com uma certa boa-vontade, humanas. E eis um problema a meditar: o desgaste que se faz, no Brasil, nas máquinas de carne e osso. Vá o leitor assistir de manhã ou de tarde, a uma partida ou chegada dos trens suburbanos em que viajam essas máquinas de carne e osso. Ali, sim, é possível observar o desgaste violento, quase aflitivo, das maquinarias. É difícil acreditar que estamos ali diante da mesma espécie de animal que se exibe nas areias de Copacabana. A maioria das mulheres e dos homens, inclusive das crianças, tem um ar de coisa usada – a abusada. Uma infinidade de gente mal-acabada e maltratada, um rebanho triste de povo fraco ou doente, cujas caras refletem aborrecimento e necessidade - e onde brilha apenas, raro e raro, a beleza viril de algum rapaz atlético ou a graça fresca de alguma jovem morena. E até esses bons exemplares despertam melancolia, parecem incapazes de resistir durante muito tempo, são arvores sãs numa plantação que a praga de mil dificuldade e deficiências vai estragando.
É que as criaturas humanas são máquinas muito delicadas - e não há outras máquinas neste país de que se cuide menos. Pobres máquinas de carne e osso! Para mantê-las em bom estado de funcionamento, para que rendessem mais e durassem mais, seria preciso que recebessem, na ração que a Vida lhes oferece todo dia, um pouco mais de carne e um pouco menos de osso- desses ossos inumeráveis que a maioria de nossa gente tem de roer com tanta fúria e tão maus dentes, e daquela carne que não é apenas a que tantas vezes não existe no fim das intermináveis filas, mas também tudo o que na vida tem sustância e sangue, as alegrias mais naturais e necessárias ao corpo e à alma a que todos tem direito e tão poucos têm acesso. E dizer que outro dia eu li um artigo de um cavalheiro, no jornal, dizendo que o nosso povo precisa se fortalecer fazendo ginástica! Ah, ginástica, ginástica! Ginástica para viver, ridícula e patética ginástica que tanta gente faz todo dia simplesmente para isso: para continuar. Ah, ginástica” Isso cansa, meu caro senhor, isso cansa.
Março, 1944.

FRASE DA NOITE

"Eu não obrigo ninguém a fazer o que não gosta... Eu só faço o que eu gosto" (Gonzaguinha, em 1990)

Uma sexta-feira.

Era uma sexta feira normal. Fui a um bar que prima pela cerveja gelada, o calor humano e o samba de qualidade. Tudo a um preço que chega a dar esperança ao capitalismo. Tanta vida, tanta cerveja, e o samba que traz cantoria e sorrisos gratuitos, custando algumas folhas de papel fedorento me soa um grande negócio. Foi nessa sexta, há muitos meses atrás, que a encontrei. Foi a primeira mulher que vi na casa, marcou algo em minha mente, alugou um espaço no meu campo cerebral. Não sei explicar o quê, pois digo, que nesse primeiro momento, ela era dessas que se diz que há outras mais lindas. Penso que o fato de ser magrela e branca demais ajudou na gravação de sua imagem em minha mente. Gosto de mulheres magras. Era bela sem dúvida, parecia uma princesa européia de um país tipo Romênia, mas uma beleza que se forjava em minha mente. Nada pronto, por favor. Um certo olhar triste que é fundamental, algo que não posso definir aqui, mas que convém dizer e abrir parênteses, sem de fato escrever parênteses, que tristeza não é diferente de alegria. Assim como “Quem disse que sorrir é ser feliz”, não é, pelo menos não necessariamente. Gosto da metáfora do palhaço que depois da apresentação chora de tristeza.
Ela passou por mim e incomodou. Pensava na velha ladainha que andava me levando a ação: “Eu sou um bosta... eu sou um bosta... eu sou um bosta”. Bem, mas ela passou, depois voltou e depois de pensar 17 vezes que era um bosta, ao invés de negar a afirmativa, acabei acreditando na mesma e nada fazendo. Como um bosta que acreditei ser, não possuía características morais para encarar uma mulher triste.
Ela continuou lá. Eu, aqui, esboçava olhares enviesados e meio petulantes que não encontravam muita atenção do lado de lá. Em alguns momentos peguei seus olhos de encontro aos meus. Já se preparava para acabar o show, o show de samba, lembro que olhava pra ela, da mesma forma - só pra reforçar a idéia - que um goleiro olha pra bola na hora do pênalti. Com um gesto arrogante com a mão, chamei-a para perto de mim. Ela, por sua vez, chamou-me para o seu lado, resisti e não fui, pois ela estava coberta por seres humanos, e ir lá me deixaria sem graça. Sou tímido. Ela veio. Lembro que havia pensado uma cantada e que a achava genial. Só o tempo comprova a babaquice de algo que no passado “era genial”. Quão idiota. Eu simplesmente diria a ela uma frase que li de Mario Quintana e que até não concordo muito. Diria eu: “Sabe que tem uma frase de um poeta que diz que quem não compreende um breve olhar, tampouco compreenderá uma longa explicação”, para arrematar e completar o quadro do conquistador barato, diria que não estava disposto a dar longas explicações. Olharia em seus olhos por um breve instante e lhe daria um beijo. Ela me salvou de tamanho fracasso e de uma grande demonstração de estupidez.
Logo ao chegar perto de mim, e antes que eu começasse a patética cena, a moça falou que me conhecia da faculdade, “eu já te vi na FAFICH”. Ao ouvir isso, fiquei surpreso e feliz. Conversamos muito, ela, uma futura socióloga que não queria formar para dar aula; e eu um estudante de psicologia metido a conhecer os assuntos das ciências sociais. O mundo desistiu de nós. Conversamos muito. Um muito que não foi demais. Fosse um filme ou uma peça de teatro, diria que aquele momento de minha vida fora digno de uma grande cena. Os críticos diriam que nunca houve tanta química entre dois atores, que os diálogos eram dignos de Tarantino, o figurino, o som, e a trilha sonora...Que primor! A casa estaria lotada por muitos fins de semana, seriam quebrados recordes de bilheteria. Habitando uma realidade paralela, peguei em sua mão lentamente, sem nervosismo e afetação, sem demora ou pressa, sem pudor, mas calmamente e o beijo, não digo que chegou a ser um beijo, foi algo diferente. Uma espécie de continuação da palavra. Continuamos a sentir na carne o que era óbvio na nossa conversa. Ficamos juntos pouco tempo, disse a ela que ligaria no dia seguinte. Peguei seu telefone. Demoramos para conseguir despedir, eu não queria que ela fosse embora. Ela pegou meu telefone, o que achei lindo, apesar de até agora estar esperando seu telefonema que nunca veio. Nos vimos algumas vezes, mas agora o filme mudou. Os críticos diriam que depois de um inicio triunfal, o filme se perde em um enredo enfadonho. Mas a vida não é um filme, talvez sejam muitos. E na imensa transitoriedade e efemeridade da vida, quero guardar aquele momento como um auge de minha existência, não pela sensação de futuro, não pela vontade de vê-la sempre, não pela sensação de conforto que ela me deu, mas sim pela palpitação em meu peito quando de seu aproximar, e da sensação, estranha nesses tempos, de que eu não sou um robô, e nada mais.

palavras que não existem

Essa idéia de deixar as palavras na própria cabeça em um lugar onde elas nem deveriam existir. Esse conceito da vergonha de se expressar, o medo do que o outro vai pensar, nos afasta de quem um dia, sentiremos falta.
A verdadeira noção de que amanhã, virá o raiar esperado e pontual do sol, o espectro dessa beleza natural que marca a passagem da vida , mais do que inclusive deveria marcar; já que a vida deveria ser marcada pela passagem do beijo, do choro e do gozo, da roda de samba e do aumento de preço da cerveja. Essa técnica “desconhecida” da precisão da natureza que nos leva a ser assim pontuais e previsíveis. Essa estupidez de achar que a grande graça de tudo é o manter, o empate: um bom resultado, sem perceber que a graça está no sorriso descontrolado.
O mundo para muitos é esse ai e é bom, pra alguns não há nada de bom, os sensatos, no entanto, reconhecem a beleza do casal que namora na mesma praça, há dezenas de milhares de poentes, mas também reconhece a tristeza de se ver valorizada a mediocridade, de se ver a exploração do sofrimento, a banalização do sentimento. Esse choro dissimulado desses que tentam ensaiar na vida, mas como alguém já disse: a vida é o próprio ensaio dela mesma, não há tempo pra se ensaiar. Fiquemos então com o improviso, improvisemos mais, deixemos o outro falar, que se espere ouvir pra então se dizer, que se deixe as palavras entrarem na cabeça, fazerem sentido, produzirem uma emoção, uma dor, caminhando pelo trajeto desconhecido da mente e culminando numa grande demonstração de qualquer coisa. Que não sejamos enganados por palavras e falas prontas, que se valorize a capacidade de se estar vivo e presente a cada momento,de responder na hora, de mudar de idéia, de sorrir ou chorar.